Apesar de estar previsto em lei, há anos a mãe e a avó de uma jovem autista de Garça (SP) tentam uma vaga na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae)
da cidade para o tratamento. Sem solução, o tempo e a falta de resposta
revelam o drama da família.
Ambas vivem somente para cuidar de Jéssica
Nogueira, de 18 anos. Autista, a disfunção foi descoberta quando ela
tinha 2 anos.
A avó conta que desde os primeiros dias de vida, a menina
apresentava comportamento diferente dos outros bebês, mas o diagnóstico
demorou a vir.
Jéssica vive em um universo que beira a escuridão. Ela cresceu atrás do
portão de casa e desde a infância, nunca conseguiu se relacionar com
outras crianças. E a luta da família para entender o problema e buscar
tratamento é uma batalha que já dura 16 anos e que parece não ter fim.
“Ela não sai de casa porque temos medo de alguém fazer alguma maldade
com ela. Se levamos no parquinho ou lanchonete as pessoas ficam olhando
como se fosse um bicho. Já ouvimos até a frase ‘se é louca deixa presa’.
Por isso nos fechamos com ela”, diz a mãe de Jéssica, Andréia Nogueira.
Após a descobrir que Jéssica tinha autismo, a avó passou a dedicar todo
o tempo para cuidar da neta, o que incluíram muitas idas e vindas a
Apae de Garça, mas nunca conseguiu matricular a menina.
Segundo ela, a
instituição alega não ter especialistas para atender o grau de autismo
da jovem. “As portas se fecham em todos os lugares que vamos. A Apae
daqui diz que não possui gente especializada para cuidar dela. Por causa
disso entrei até em depressão”, conta Ivone Nogueira.
Sem apoio, Ivone, com quem Jéssica sempre morou, vive uma rotina
difícil para lidar com a disfunção da neta. Jéssica nunca chegou ao
menos entrar em uma escola, passa o dia inteiro dentro de casa e quase
sempre anda de um lado para o outro.
Além disso, ela dorme pouco e pesa
110 quilos. Para cuidar da neta, a avó conta apenas com o benefício que a
jovem recebe do governo, mais a aposentadoria da avó. São dois salários
mínimos para pagar prestação da casa, comprar comida e os medicamentos
de Jéssica.
Para que consigam voltar a trabalhar, a família tenta, por mais um ano,
conseguir uma vaga na Apae. No entanto, Ivone sai da instituição com a
mesma resposta. “Mais uma vez eles falaram que a Jéssica vai passar pela
triagem e eu sei que eles não vão atender”, diz.
Sobre o caso, a Apae de Garça informou que foi oferecida assistência à
Jéssica e que ela foi encaminhada várias vezes a entidade desde 1998,
mas que a avó não compareceu mais e também não justificou a ausência. No
último dia 21, novamente a avó compareceu pedindo uma vaga e foi
orientada a aguardar contato para agendamento de triagem.
Em Marília a entidade "Espaço Potencial", parceira da Apae, pode
atender a Jéssica na sexta-feira, às 13h30 para avaliação. Se aprovada
ela poderá ter atendimento diário em meio período.
Então, a família tem
duas opções - ou aguardar a triagem e futura vaga em Garça ou na
entidade de Marília. A prefeitura de Garça ofereceu transporte para a
menina de casa até a Apae. Para Marília, a prefeitura só vai levar a
jovem caso não haja atendimento no próprio município.
Já em Assis, o município faz um atendimento com excelência para pessoas
com autismo. Profissionais de diversas áreas ajudam no desenvolvimento
físico e intelectual dos deficientes.
O projeto Fênix é destinado a
pessoas da cidade que tenham a disfunção e é mantido pela Secretaria de
Educação. Diariamente, um ônibus da prefeitura busca e leva os alunos em
casa.
Já na chegada os estudantes são recepcionados pelos professores. Cada
profissional fica responsável por um aluno. As rotinas que cada
estudante deve realizar no seu dia a dia ficam em um quadro.
O
estudante, por exemplo, pega uma foto de uma xícara de café e fica
responsável pela tarefa de preparar o café. O jovem Luiz Henrique ficou
com essa responsabilidade. Com uma referência, ele verifica a
quantidade de pó e açúcar que precisam ser colocados, prepara a água e
coloca no fogo.
Toda a rotina é acompanhada de uma profissional e depois finalizada por
outro estudante. “Percebemos que o aluno tem uma autonomia e realizamos
a tarefa. No momento em que ele faz o café, ele está lidando com
perigos como água quente e fogo.
Quando eles conseguem realizar a
rotina, temos a segurança que eles são capazes de lidar com a situação
sem correr riscos”, diz a responsável pelo projeto, Viviane Del
Massa. “Não existe uma idade pré-definida.
O projeto é feito dentro de
um plano individual e a partir do momento em que vemos que eles possuem
as habilidades vamos repassando as rotinas. Se o café oferecer riscos,
começamos pelo suco, que só mexe com água, ou seja, fazemos outras
atividades até chegar nas mais complexas”, completa.
O autismo é considerado um transtorno. Na novela Amor à Vida a
personagem Linda, vivida pela atriz Bruna Linzmeyer, tem autismo. Na
ficção ela faz diversas atividades como caminhar na esteira e pintar
para conseguir mais autonomia.
Em Assis, os estudantes também fazem
várias atividades como exercícios manuais e trabalho com a concentração.
“Fazemos atividades para trabalhar com a coordenação motora. Todas são
voltadas para o dia a dia como abrir uma torneira, uma pasta de dente ou
pegar algo pequeno, por exemplo”, explica a pedagoga Valéria Dias.
A Unesp cede nove estagiários que se revezam diariamente e ficam
responsáveis pela brinquedoteca.
O cadastro para a inclusão no projeto é
feito pela Secretária de Educação e de acordo com o órgão, não existe
uma fila de espera por vagas. Entre as atividades oferecidas, para
aproveitar o dia de sol e calor o educador físico, monta um circuito
onde e eles aprendem a ter equilíbrio e enfrentar os obstáculos que
possam surgir.
“Nós colocamos placas em diversas posições para que eles possam
melhorar o equilíbrio e posicionamento. Desta forma eles conseguem
realizar rotinas do dia a dia, como, por exemplo, subir uma escada sem
problemas”, ressalta Adelson Holmo Júnior.
Na atividade de caminhada são atendidos 17 estudantes com idades entre 3
e 30 anos. Seis deles frequentam a escola regular e vem ao projeto duas
vezes por semana. Os outros onze vem para o projeto Fênix todos os
dias. As turmas são separadas nos períodos da manha e a tarde.
“Nós
contamos com esse espaço com muito verde e ar puro. Para eles é bom
porque eles se socializam, encontram pessoas que param e conversam. Para
os alunos é importante visto que dentro do aspecto do autismo uma das
dificuldades é a interação social”, completa a responsável pelo projeto.