No último dia 28 de agosto, o escritor e jornalista Roberto Amado, 
sobrinho de Jorge Amado, deu início a uma história que tomaria grandes 
proporções nas semanas seguintes. 
Publicou em seu site, o Poucas Palavras, um longo texto dizendo que o craque argentino Lionel Messi foi diagnosticado aos oito anos de idade com Síndrome de Asperger, uma forma branda de autismo que se caracteriza, entre outros sintomas, pela grande capacidade intelectual de quem tem a síndrome.
 Apesar das prováveis boas intenções, como a de mostrar que os autistas 
são capazes de feitos extraordinários, Amado estava errado. Quem o 
contradiz é Diego Schwarzstein, médico que tratou do 
principal e conhecido problema de saúde de Messi: uma deficiência 
hormonal que atrasou seu desenvolvimento.
Procurado pela reportagem do UOL Esporte, Schwarzstein, que ainda vive 
em Rosario e é a pessoa mais qualificada para falar sobre o assunto, foi
 taxativo. "Leo nunca foi diagnosticado como Asperger ou qualquer outra 
forma de autismo. Isso é realmente uma bobagem", afirmou, por e-mail.
Em seu texto, Amado listou uma série de características que 
supostamente serviriam para provar o autismo de Messi: o modo de chutar 
ao gol e o uso de dribles parecidos seriam indícios de padrões 
repetidos, típicos de pessoas com a síndrome. Sua timidez no trato com a
 imprensa seria outro sinal.
 
 
No mesmo artigo, ao destacar os feitos impressionantes dos quais os 
autistas são capazes, Amado citou o caso retratado no filme Rain Main,
 de 1988, com Tom Cruise e Dustin Hoffman. 
Na verdade, trata-se de outro
 tipo de autismo, o savant, no qual a pessoa tem uma grande facilidade 
em uma área intelectual, como realizar cálculos complexos, por exemplo, 
mas possui um QI baixo - algo bem diferente do Asperger.
O texto de Amado, por trazer depoimentos de pessoas ligadas a entidades
 de portadores de Síndrome de Asperger corroborando sua tese, foi pouco 
questionado e acabou se alastrando pela internet. 
Até o deputado federal
 Romário chegou a escrever a respeito em sua conta de Twitter: "Vcs 
sabiam q o Messi tem Síndrome de Asperger? É uma forma leve de autismo, q
 deu a ele o dom do foco e concentração acima de tudo e de todos." Alguns
 sites chegaram a noticiar que, depois do comentário de Romário, Jorge 
Horacio Messi, pai do craque argentino, teria ameaçado processar o 
ex-jogador brasileiro.
 Apesar do nome diferente, a Síndrome de Asperger é uma das formas de 
autismo, porém mais branda. Enquanto os autistas, inclusive os de 
savant, possuem graus diferentes de deficiência intelectual, as pessoas 
com Asperger são extremamente inteligentes.
O psiquiatra Estevão Vadasz, coordenador do Programa de Transtornos do 
Espectro Autista do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das 
Clínicas da USP (PROTEA), uma das maiores autoridades do Brasil no 
assunto, explica que a área de excelência do portador da Síndrome de 
Asperger costuma ser matemática, física e outros campos de exatas.
"Outro fator que vai contra a ideia de que Messi é portador de Asperger
 é a coordenação motora", afirma Vadasz. "Na maior parte dos casos, os 
portadores têm baixa motricidade e não se dão bem em atividades em 
equipe. O Messi, ao contrário, tem um domínio motor sofisticado, e joga 
muito bem em equipe."
O escritor italiano Luca Caioli, autor da biografia Messi, The Inside 
Story of the Boy Who Become a Legend, que será lançada no final do ano 
no Brasil pela L&PM Editores, esteve em Rosario, na Argentina, 
cidade natal de Messi, para obter informações para o livro.
Conversou com a família do jogador e com o médico Diego Schwarzstein, 
que foi o primeiro a diagnosticar o problema hormonal que afetava o 
crescimento de Messi. "Ele era muito fechado em si mesmo e falava pouco,
 mas nunca soube de nenhum diagnóstico de Síndrome de Asperger", disse 
Caioli.
Outro jornalista que prepara uma biografia de Messi, o espanhol Guillem
 Balague, de Barcelona, que comenta o Campeonato Espanhol para a Sky 
Sports e já escreveu um livro sobre Pep Guardiola, foi taxativo: "essa 
história é um lixo."
Atletas autistas
Existem pelo menos dois casos notórios de autistas que superaram os 
limites impostos pela síndrome. Em 2006, aos 18 anos, o americano Jason 
McElwain protagonizou uma história incrível. 
Diagnosticado com autismo 
logo nos primeiros anos de vida, sempre foi um apaixonado por basquete. 
Por isso o técnico do time da escola de McElwain, Jim Johnson, deixava 
que ele ficasse no banco de reservas acompanhando as partidas.
No dia 15 de fevereiro de 2006, na última partida da temporada, o 
técnico deu o uniforme do time a McElwain e o avisou de que se, no final
 da partida o time estivesse liderando o placar com folga, ele poderia 
entrar. Faltando quatro minutos para o fim da partida e com um diferença
 de dois dígitos, Jason entrou em quadra. O começo indicava uma situação
 constrangedora. A bola foi passada pra ele. O arremesso sai errado. 
Novo arremesso, novo erro.
O que se viu a partir daí, no entanto, foi épico. McElwain acertou nada
 menos que seis arremessos de três pontos e mais um de dois pontos, 
totalizando 20 pontos em pouco menos de quatro minutos. 
A cada cesta 
convertida, a torcida explodia no ginásio da escola. O time de McElwain 
venceu por 79 a 43. O show de Jason foi eternizado ao receber o prêmio 
ESPY de melhor momento do esporte em 2006, dado pela TV por assinatura 
americana ESPN, batendo os 81 pontos marcados por Kobe Bryant em uma só 
partida aquele ano.
Além de dar palestras sobre o autismo, McElwayn escreveu um livro que 
conta a experiência vivida naquele dia. Os direitos foram comprados por 
um estúdio de Hollywood e um filme deve ser produzido em breve.
Outro exemplo de superação é o do surfista americano Clay Marzo, de 24 
anos. Apesar de surfar desde pequeno e de ganhar prêmios aos dez anos de
 idade e assinar seu primeiro contrato aos 11, ele só foi diagnosticado 
com Asperger aos 18 anos. 
Até então, algumas atitudes suas não eram bem 
vistas no circuito profissional, como a falta de traquejo social com 
patrocinadores, fãs e colegas de surfe, além de nem sempre seguir 
corretamente as regras das competições.
Em 2008, o documentário Clay Marzo: Just Add Water (Clay Marzo: Basta 
Adicionar Água) retratou a dualidade entre o surfe e a síndrome de 
Asperger na vida de Marzo. Atualmente, ele é voluntário em uma 
organização que apresenta o surfe para crianças com autismo.
Fonte: UOL Esporte
 


