Pessoas com deficiência visual usuárias de cães-guias deram início à
mobilização para redução de custos de manutenção dos animais, em Santa
Catarina.
Entregues gratuitamente por exigência da lei brasileira, os
cães-guias passam a ser custeados pelos novos donos assim que iniciam o
trabalho. Uma ajuda de valor inestimável, mas que pesa no bolso: os
gastos com os animais chegam a R$ 600 por mês.
— O que ele faz por mim não tem preço. Passei a ter independência,
uma vida ativa. Mas queremos encontrar uma maneira de deixar a
manutenção mais barata, até para que mais pessoas tenham acesso ao
cão-guia — diz Felipe Cristiano da Silva, 24 anos, estudante de Relações
Internacionais, que tem a companhia do labrador Thor há um ano e meio.
Felipe organizou o primeiro encontro do grupo, em espaço cedido no
fim de semana pelo Instituto Federal Catarinense (IFC), em Camboriú,
onde fica o primeiro Centro de Treinamento de Instrutores de Cães-Guias
custeado pelo Governo Federal no país.
As discussões incluem formar uma
associação para pleitear compras conjuntas de materiais para o cão — o
que reduz custos em até 25% — e a mobilização para criar uma lei que
garanta redução de impostos na compra de ração, por exemplo.
A ideia é semelhante à lei que isenta às pessoas com deficiência o
pagamento de impostos como IPI e ICMS na compra de um veículo. A
estimativa é que, no caso da ração, a medida reduzisse em pelo menos 17%
o custo do pacote. Levando-se em conta que os cães-guias precisam de
alimentação de alta qualidade, para melhorar a performance e a
expectativa de vida, o desconto é providencial: o saco de ração custa
hoje de R$ 200 a R$ 250.
Cego e ativista das causas da pessoa com deficiência, o
fisioterapeuta Sidnei Pavesi, de Brusque, ressalta que o alto custo da
manutenção limita o perfil dos cegos ou pessoas com baixa visão que
podem fazer uso do cão-guia.
No cadastro nacional há mais de 400
candidatos a receber um cão, mas sabe-se que o número pode ser muito
maior.
Há no Brasil 6 milhões de pessoas com deficiência visual,
considerando-se cegueira total e baixa visão. Pelo menos 150 mil
poderiam ser beneficiadas por um cão-guia.
— Precisamos repensar as políticas públicas que envolvem o cão-guia —
diz Pavesi, que já viajou o mundo com o golden retriever.
Acesso livre
Além das questões econômicas, outra bandeira da associação de
usuários de cães-guias é a conscientização sobre o livre acesso.
A lei
brasileira garante aos animais acesso a qualquer estabelecimento público
ou privado, com restrições apenas em áreas cirúrgicas, de manipulação
de remédios ou alimentos.
O mesmo vale para os filhotes, que estão em
fase de socialização. Mas os relatos de desrespeito à legislação são
constantes.
Cezar Oliveira, que vive em Palhoça e há um ano recebeu o golden retriever Duster, já passou por constrangimentos:
— Ônibus que não param, coisas assim. Quando ouço alguém falar,
criando dificuldade, argumento. Mas sei que muitos fazem cara feia, e
não posso responder porque não enxergo.
A lei prevê multa de até R$ 30 mil para estabelecimentos que coibirem
entrada de cão-guia acompanhado de pessoa com deficiência visual ou do
socializador, e até interdição em caso de reincidência.
Respeito e sensibilidade são palavras-chave numa relação que vai
muito além da companhia. Os cães fazem as vezes de olhos para quem não
pode enxergar, e são responsáveis por uma mudança de vida incomparável.
Como relata Gabriel Toledo, estudante de Psicologia que encontrou a
independência ao lado do dourado Cedar após ter perdido a visão, dois
anos atrás.
— Eu não tinha mais vontade de continuar. Esse pequeno animal de
quatro patas me mostrou que tinha um sentido em seguir em frente. Eu
estava cego no meu mundo, e ele me mostrou um outro mundo. Me trouxe
vontade de viver.
Fonte: Diário Catarinense / Vida Mais Livre
Nenhum comentário:
Postar um comentário