Os programas Ski Dreams (Sonhos de Esqui) integram a reabilitação de
crianças e adultos com deficiência. Com auxílio de instrutores
experientes, pessoas que antes sequer podiam andar, aprenderam a
esquiar, na Rússia.
A reabilitação e socialização de pessoas com deficiências é um
problema agudo no país, o que torna o projeto é realmente singular.
Quando sua filha Alice recebeu o diagnóstico de paralisia cerebral
infantil, Maria Tsvetkova passou a “literalmente viver em hospitais” de
Moscou, além de frequentar cursos de reabilitação na República Tcheca e
na Eslováquia.
No ano passado a família optou por um novo tipo de reabilitação: o
programa Ski Dreams.
“Alice começou a andar. Seus calcanhares, seu andar e seus movimentos ganharam firmeza. Os cursos não são exaustivos –é um exercício agradável e interessante. Alice, que está com 6 anos, espera com impaciência enorme pelo próximo treino. Ela confia profundamente nos instrutores e presta atenção ao que eles dizem”, fala sua mãe.
Segundo dados do Serviço Federal de Estatísticas russo, em 2015 havia
12,4 milhões de pessoas com deficiência física na Federação Russa, e o
número de crianças com deficiências chegava a 604 mil.
De acordo com
várias estimativas, entre 4,2% e 4,7% das crianças russas nascem com
paralisia cerebral e outras síndromes paralíticas.
Desenvolvido por uma organização autônoma e não comercial, o programa
Ski Dreams dá aulas de esqui a adultos e crianças com deficiências
físicas e mentais.
“Esquiar com a assistência de instrutores qualificados e com programas e equipamentos criados especialmente permite que o processo de tratamento, reabilitação e socialização seja acelerado significativamente para todas as categorias de pessoas com limitações de saúde congênitas e adquiridas no espectro neurológico, a começar dos 3 anos de idade”, diz a coordenadora do programa, Julia Gerasimova.
Ekaterina Yudina é mãe de Leo Yudin, 13, de Izhevsk, que só começou a
participar do programa em fevereiro deste ano.
“Leo não vê ‘Ski Dreams’ como reabilitação”. “Aqui a gente anda, brinca e se comunica. A reabilitação é imperceptível e indolor. Não é preciso convencê-lo a ir aos treinos. A cada vez percebemos que seus movimentos estão mais confiantes, suas costas estão mais retas e sua autoestima aumenta”, ela disse.
De acordo com depoimentos da organização Ski Dreams, o programa
melhora a condição dos participantes.
Depois de duas ou três semanas de
treinos, as funções motoras dos pacientes com paralisia cerebral
infantil melhoram e crianças com problemas do espectro de autismo
começam a comunicar-se ativamente com outros. Houve até casos de
crianças com transtornos do espectro do autismo que não falavam, mas
desenvolveram a fala.
O programa já recebeu o apoio do Centro Científico e Prático para a
Reabilitação Médica e Social de Inválidos do Departamento de Proteção
Social de Moscou, onde a avaliação científica do programa é feita sob a
direção da médica Svetlana Olovets.
Mas o projeto começou há apenas dois
anos, em janeiro de 2014, quando o ator e apresentador de TV Sergey
Belogolovtsev e sua mulher, a jornalista Natalya, criaram o Ski Dreams
em Moscou.
Seu filho Evgeniy tem paralisia cerebral infantil há 26 anos e passou
seus seis primeiros anos de vida sem andar.
A família tentou vários
métodos de reabilitação, incluindo um programa de esqui nos EUA que,
inesperadamente, foi o que funcionou melhor.
Existem programas de
reabilitação de deficientes através do esqui há mais de 30 anos nos EUA,
Canadá e Austrália, de modo que Sergey e Natalya Belogolovtsevi
decidiram criar o primeiro projeto semelhante na Rússia.
“Nossa experiência mostra que os programas de reabilitação pela prática do esqui são especialmente eficazes com pessoas com deficiências do sistema musculoesquelético (paralisia cerebral infantil, consequências de traumas da espinha, lesões cerebrais), com autismo, síndrome de Down e também com deficiência visual ou auditiva parcial ou completa”, diz a organização.
O programa funciona hoje em 16 regiões da Rússia, de Moscou à
república da Udmúrtia e da região de Ryazan a Krasnoyarsk Krai.
Mais de
3.000 pessoas ao todo, dos 3 aos 62 anos de idade, já passaram pela
reabilitação. Além dos programas de reabilitação propriamente ditos, o
Ski Dreams treina voluntários e instrutores certificados.
O programa é
operado como franquia social: organização pública, a Ski Dreams prepara
instrutores através de seus programas, manufatura equipamentos sob seu
controle e vende esses equipamentos a estações de esqui, fazendo o
monitoramento qualitativo e quantitativo dos serviços prestados.
Os pais pagam pelos programas pessoalmente, ou, em casos de falta de
recursos, podem receber uma bolsa dos patrocinadores do programa, que
são doadores privados e empresas comerciais.
A companhia siberiana de
energia à base de carvão, por exemplo, patrocinou a abertura de um
centro especial de reabilitação na região de Kemerovo.
Em muitas cidades os projetos são patrocinados por estações de esqui.
Em Moscou, duas sessões semanais custam cerca de 3.000 rublos (US$50)
com 1 instrutor ou 6.000 rublos com 2 instrutores. Em outras cidades
e regiões os preços são mais baixos.
A título de comparação, segundo a
organização, um dia de tratamento no centro ambulatorial do Ministério
do Desenvolvimento Social, em Moscou, sai por 5.000 rublos (US$75).
A coordenadora do programa, Julia Gerasimova, diz que o Ski Dreams
está tentando obter verbas do governo.
“Gostaríamos muito que o programa recebesse status médico, porque seu efeito é evidente e porque pode já ter sido prescrito em programas individuais de reabilitação”, diz Maria Tsvetkova, mãe de Alice, 6.
A organização pretende aumentar o número de centros e criar um
sistema de análises médicas para medir a eficácia do programa, e o Ski
Dreams está procurando novos recursos e investidores para ampliar o
programa, criar novos métodos de reabilitação e aprimorar os já
existentes.
“A ausência de verbas específicas para o desenvolvimento de programas é um dos problemas mais prementes. Esperamos atrair a atenção de potenciais ‘anjos’ empresariais que possam ajudar com isso”, diz Julia Gerasimova.
Fonte: Folha de S. Paulo / Vida Mais Livre
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