Na maioria das vezes, eles possuem bons conhecimentos profissionais,
podem pensar de forma lógica e analítica e têm boa capacidade de
concentração – mesmo em tarefas que precisam ser repetidas várias vezes.
Eles são detalhistas, precisos e têm um alto padrão de qualidade. Mas
nem sempre as empresas correrem atrás de tais empregados.
Por volta de 250 mil autistas com a síndrome de Asperger vivem na
Alemanha. Trata-se de uma forma mais branda do autismo, cujos portadores
possuem as qualidades acima mencionadas. Apesar disso, eles são
frequentemente classificados como inaptos para trabalhar pela Agência
Federal do Trabalho alemã.
Somente 15% das pessoas com a síndrome de Asperger têm um trabalho
normal. O motivo é que elas têm problemas para se integrar num ambiente
social de trabalho. Fica difícil atender às exigências das empresas:
espírito de grupo, sensibilidade em lidar com outras pessoas e
habilidade de comunicação.
Tobias Altrock, 26 anos, tem autismo de Asperger. Ele largou a escola
no segundo ano do ensino médio. Até o fim deste ano, ele estava à
procura de uma vaga como aprendiz num programa de formação profissional
de alguma empresa.
“Não foi por causa das notas”
“Eu me candidatei muitas vezes, mas nunca fui aceito. Tentei encontrar
uma vaga de aprendizado profissional”, disse Altrock. “Com certeza não
foi por causa das notas, isso já me foi dito várias vezes. Meu
psiquiatra me explicou que ele também não me contrataria, se eu fosse
convidado para uma entrevista de trabalho. Pode-se ver no meu rosto que
sou diferente e que não funciono da forma como geralmente se espera no
mercado de trabalho.”
No entanto, no início de novembro, Altrock ganhou finalmente uma
oportunidade na vida profissional. Ele foi empregado como consultor
júnior na Auticon, uma firma de assessoria em Berlim – e com salário
normal de mercado. A Auticon disponibiliza trabalhadores com síndrome de
Asperger como consultores de TI (Tecnologia de Informação) para
empresas.
A firma foi fundada há cerca de um ano por Dirk Müller-Remus, que
deixou para trás seu cargo de executivo numa empresa de tecnologia
médica.
“A mudança foi ocasionada pelo fato de eu ter um filho com
síndrome de Asperger”, disse. Segundo Müller-Remus, seu filho quase não é
capaz de dar conta de sua vida cotidiana, mas possui enormes talentos e
qualidades.
Para Müller-Remus, era difícil imaginar que seu filho poderia exercer
uma profissão normal. “Daí tive a ideia de fundar uma empresa que se
baseasse nos pontos fortes de autistas.”
Bons na gestão de qualidade
Os pontos fortes de muitos autistas com síndrome de Asperger estão
principalmente na área de gestão de qualidade, diz Müller-Remus. Na
maioria das vezes, eles podem pensar de forma bastante estruturada,
analítica e lógica. E como há uma grande demanda por testadores de
software, sua firma se especializou em treinar portadores da síndrome de
Asperger nessa área e disponibilizá-los para empresas.
Para tal, a Auticon se baseia no conhecimento profissional que o
candidato já possui. Muitos dos autistas com síndrome de Asperger
aprendem temas da Tecnologia de Informação de forma autodidata. “Desde
que tenho oito anos de idade, eu me interesso por questões de
informática, por programação, hardware, software e lógica em geral. Tudo
o que está ligado a algoritmos e lógica, esse é o meu talento, é o que
eu posso fazer muito bem”, disse Altrock.
Para que um ambiente normal de trabalho não seja obstáculo para um
consultor de TI, a Auticon lhes disponibiliza os chamados treinadores de
trabalho, como Elke Seng. Num estágio inicial, ela identifica qual
ambiente se adapta a cada funcionário, qual o tipo certo de iluminação,
que tipo de barulho deve ser evitado, onde deve se localizar a mesa de
trabalho, se a temperatura deve ser mais quente ou mais fria.
Quando, então, o consultor é inserido em alguma empresa, ela é
responsável pela concepção adequada do local de trabalho e conversa com
outros funcionários e com os chefes sobre as características do autismo
de Asperger.
“Muitos têm medo de autistas e pensam que eles podem fazer
algo errado ou quebrar alguma coisa”, disse Seng. Segundo Müller-Remus, é
preciso simplesmente “informar as firmas, bem e abertamente, que está
chegando alguém que é diferente e de que forma ele é diferente”.
Expansão planejada
Em Berlim, até o momento, a Auticon já empregou seis consultores. Até o
fim do ano, esse número deverá se elevar para 12. Também em Munique
encontra-se em planejamento uma nova filial que deverá empregar, no
início do próximo ano, seis autistas com síndrome de Asperger.
E graças a uma cooperação com a firma de telefonia móvel Vodafone,
quatro postos de trabalho para portadores da síndrome de Asperger irão
surgir numa nova filial que está sendo montada em Düsseldorf. Enquanto
em outros países já existem empresas similares, na Alemanha, a Auticon é
a primeira a treinar autistas com síndrome de Asperger para empresas.
O filho de Müller-Remus ainda não pôde se beneficiar da empresa de seu
pai, pois seus talentos estão na área musical. Segundo levantamentos
estatísticos, somente 15% dos autistas com síndrome de Asperger se
interessam pela área de TI, disse Müller-Remus.
Por esse motivo, ele considera expandir gradualmente o portfólio de
serviços da Auticon em torno do tema da gestão de qualidade. De modo
que, no futuro, também possam ser empregados funcionários que tenham,
por exemplo, seus pontos fortes nas áreas de idiomas e música.
Vantagens econômicas
Para a economia alemã, significa o aproveitamento de um grande
potencial inexplorado; para o Estado, uma carga menor de assistência
social. Mas e para os afetados?
“Eu ouvi e li biografias muito tristes e muito chocantes”, explicou
Elke Seng. “Para muitos, e isso eles mesmos dizem, trata-se da última ou
única oportunidade que tiveram no mercado de trabalho.”
Na Auticon, disse Seng, o potencial de tais empregados pode florescer
num espaço mais curto de tempo. “Outro dia, um dos novos funcionários me
disse: ‘Sra. Seng, na verdade eu tinha uma consulta com o psiquiatra,
mas desde que eu comecei a trabalhar aqui, eu não preciso mais ir,
porque estou me sentindo muito bem’.”
Fonte: Deficiente Ciente
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