15 de set. de 2015

Apesar dos desafios, pessoas com deficiência mostram que é possível ter rotina normal



Aos 45 anos, a funcionária pública Vittoria Carbonara leva uma vida de altos e baixos. Tem facilidades com algumas coisas e dificuldades com outras. Tem medos e esperança, momentos de frustrações e outros tantos de alegria; como qualquer pessoa. 


A diferença é que Vittoria nasceu com uma má-formação congênita nas duas pernas e no braço direito. 


“Diferentes todos somos. Tinha duas opções: ou ficava em casa lamentando ou saía para a vida. Escolhi viver, que é muito melhor. Minha deficiência não me impede de fazer o que quero”, dispara.


Para Vittoria, o problema não é a diferença em si, mas sim o olhar cruel da sociedade, que para ela tem o péssimo hábito de impor limites para os outros. 


“Quando as pessoas nos olham, é como se o deficiente chegasse antes da Vittoria. E isso não é só com o deficiente, mas com tudo que sai do padrão ou foge daquilo que a sociedade vê como belo”, acredita. 


O desafio maior, em sua opinião, é mudar esse olhar e, claro, ampliar a acessibilidade e o acesso a direitos básicos e a oportunidades de trabalho, principalmente.


Em todo o mundo, pessoas com deficiência têm piores perspectivas de saúde, níveis mais baixos de escolaridade, participação econômica menor e taxas de pobreza mais elevadas em comparação às pessoas sem deficiência. 


Em parte, isso vem do fato de enfrentarem barreiras para acessar direitos que as pessoas sem deficiência tiveram mais cedo, como saúde, educação, emprego, transporte e informação. 


Vittoria, por exemplo, valoriza as cotas de emprego. “Mas é uma segregação positiva, não concorremos de igual para igual”, lamenta.


Antes de se formar em matemática, Vittoria ouviu de possíveis contratantes que não tinha qualificação. Depois de formada, o discurso mudou: diziam que era qualificada demais. 


As cotas, então, garantiram vagas de trabalho, mas ela defende a possibilidade de as pessoas com deficiência mostrar que têm competência de concorrer de igual para igual. 


“Muitas vagas ainda são para cargos mais baixos. Isso gera frustração, porque a competência independe da deficiência”, critica a profissional, que trabalha em um tribunal.


Poucas oportunidades

 

A incidência de pessoas com alguma deficiência tende a aumentar, em função do envelhecimento das populações e do aumento global de doenças crônicas como diabetes, doenças cardiovasculares, câncer e distúrbios mentais. 


Foi só após a Segunda Guerra Mundial, quando milhares de soldados voltaram dos campos de combate cegos e mutilados, dependentes de próteses e cadeiras de rodas, que os governos passaram a se preocupar com as pessoas com deficiência, hoje 10% da população mundial.


Segundo Antônio Luiz Marques, doutor em comportamento e gestão de pessoas e um dos autores do livro Trabalho e pessoa com deficiência (Editora Juruá), esse foi o marco histórico para a criação de políticas públicas de inclusão. Mas falta muito.


Dados do Ministério do Trabalho revelam que 72% das pessoas com deficiência estão em idade produtiva, entre 18 e 60 anos. 


“Mas, menos de 1% está empregada. Isso tem um impacto altíssimo na vida dessas pessoas”, lamenta o coordenador do mestrado em administração da Faculdade Novos Horizontes.


Pesquisas mostram que entre os dificultadores para esse maior acesso estão a segregação educacional, pois muitas escolas têm dificuldades em aceitar alunos com deficiência; excesso de zelo das famílias, que não deixam seus filhos com deficiência se exporem, promovendo um isolamento físico; e também as barreiras de locomoção. 


“Mas o trabalho é transformador. É um fator importante na construção da identidade e para a inserção social. É essencial para a pessoa com deficiência gerar seu próprio sustento, sentir-se útil”, defende Marques.

Conceito


Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), que, em 2011, publicou relatório mundial sobre o tema, a deficiência é uma questão complexa, dinâmica, multidimensional e em transformação. 


Nos últimos anos, houve a transição de uma perspectiva individual e médica para uma perspectiva estrutural e social: a mudança de um “modelo médico” para um “modelo social” no qual as pessoas são vistas como deficientes pela sociedade, e não devido a seus corpos. 


Fato é que a deficiência é um conceito em evolução. Tem a ver com barreiras comportamentais e ambientais, que impedem a participação plena e eficaz na sociedade de forma igualitária, mas não pode ser tratada como um atributo da pessoa.



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