Foi aprovado esta semana na Câmara dos Deputados um projeto de lei que institui o Dia Nacional do Teatro Acessível.
O momento não poderia ser mais propício, coincidindo com as
comemorações do Dia da Cidadania no país.
A luta, que agora continua no Senado Federal,
tem como objetivo celebrar e divulgar a cultura por meio de atividades
cênicas que utilizem práticas de acessibilidade física e cognitiva,
promovendo, assim, maior acesso da sociedade brasileira aos direitos
culturais.
De acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE),
o Brasil possui mais de 45 milhões de pessoas com algum tipo de
deficiência. Isso representa quase 23% da população nacional.
São
pessoas que, muitas vezes, têm seus direitos negados devido à falta de
estrutura e de políticas públicas que garantam seu acesso à cultura.
Um dos grandes representantes dessa luta é a ONG Escola de Gente. Em 2011, o grupo idealizou a campanha “Teatro Acessível: Arte, Prazer e Direitos”
e desde então percorre o Brasil oferecendo teatro gratuito e acessível a
crianças, jovens e adultos.
A celebração de uma data destinada a este
objetivo, inclusive, é um desmembramento desta iniciativa.
– O que a Escola de Gente e seus parceiros buscam é a garantia dos
direitos culturais para pessoas com deficiência. Queremos que tenham
mais participação e mais autonomia no acesso à vida cultural de suas
comunidades como pensadores, artistas, produtores ou plateia. É esse o
debate e o espaço de diálogo que o Dia Nacional do Teatro Acessível vai
liderar – explica Claudia Werneck, fundadora e diretora da ONG.
Desde 2003, a organização possui um grupo de teatro chamado “Os
Inclusos e os Sisos”. Iniciativa da atriz Tatá Werneck, o objetivo é
colocar o teatro – especialmente o humor – a serviço de temas como
inclusão, diversidade e direitos. Mais de 50 mil pessoas já puderam
assistir as apresentações da companhia, que viaja constantemente pelo
Brasil.
– Com meus amigos de faculdade, criei o primeiro grupo no Brasil a
fazer peças totalmente acessíveis. Isso não é mais do que nossa
obrigação; tem que ser feito. A realidade é difícil e as pessoas parecem
não entender a importância disso.
Conseguir patrocínio para viabilizar
um projeto com todas as medidas de acessibilidade é muito complicado.
Mas é sempre gratificante se dar conta do que um projeto como esse é
capaz.
Uma vez fizemos uma cena de dança muito engraçada e, por causa da
audiodescrição, os cegos riam tanto quanto aqueles que podiam nos
enxergar! – lembra Tatá.
Participante ativo da campanha e um dos pioneiros em iniciativas
nacionais, o Oi Futuro foi responsável pelos primeiros espetáculos
acessíveis para público.
Em parceria com a ONG Escola de Gente, eles
receberam a temporada de dois espetáculos do grupo: “Ninguém Mais Vai
Ser Bonzinho” e “Um Amigo Diferente?” – ambos ainda fazem apresentações
pelo Brasil.
Segundo o diretor de Cultura do Oi Futuro, Roberto Guimarães, isso
incentivou uma ação mais radical. Por isso, desde agosto do ano passado,
são promovidas sessões de teatro acessível nos centros culturais do Rio
de Janeiro e de Belo Horizonte.
– Uma das nossas missões desde a inauguração há dez anos é a
democratização de acesso às artes. Não podemos falar sobre uma
iniciativa real e verdadeira se não incluirmos portadores de deficiência
física ou intelectual.
Quando se fala em possibilitar acesso, as
pessoas pensam apenas na situação financeira. Temos, sim, atividades
gratuitas, mas sempre tentamos ir além. Queremos incluir os “excluídos”
da vida cultural simplesmente por ser difícil para elas.
Os espetáculos que contam com acessibilidade são apresentados uma ou duas vezes por mês e contam com tradução de libras, audiodescrição e vídeo legendagem.
Tudo é fruto de uma parceria com a primeira empresa nacional
especializada nop setor, a Lavoro Produções.
Os profissionais
responsáveis estudam o espetáculo em questão durante um mês antes das
apresentações, assistindo apresentações e analisando os textos. Até
mesmo os programas das peças são impressos em braile.
– A receptividade é ótima, tanto por parte das crianças quanto dos
adultos. Tem pessoas que perderam a visão depois de crescidas, por
exemplo, e possuem a lembrança de ir ao teatro.
Ao mesmo tempo, vemos
jovens muito emocionados que nunca viram uma peça por falta de
oportunidades como essa – conta Guimarães.
Recentemente, no Rio de Janeiro, o musical “Cazuza – Pro Dia Nascer
Feliz” ganhou apresentações acessíveis no Vivo Rio. Dois telões laterais
ao palco apresentavam a língua brasileira de sinais e a audiodescrição
foi realizada por meio de receptores de áudio individuais. Duas
profissionais em uma cabine de tradução simultânea reproduziam detalhes
da cena, movimentos, cenários, figurinos e todos os elementos visuais
utilizados pelos atores no palco.
Em São Paulo, o espetáculo “Tribos” dá o exemplo quando se fala em
acessibilidade. Estrelada por Antonio e Bruno Fagundes, a peça narra a
relação de uma família cujo filho é deficiente auditivo e conta com
sessões mensais de inclusão total.
– Este foi um dos maiores presentes que a peça nos ofereceu. Sempre nos
emocionamos muito nas sessões com acessibilidade. Enxergamos nessas
comunidades um público respeitoso, apaixonado e fiel.
A carência por
opções culturais criou um entusiasmo poucas vezes visto, especialmente
neste caso em que a história os toca de uma forma muito pessoal. Os
relatos pós-peça são arrebatadores.
Pode parecer que estamos os
ajudando, mas são eles que nos tornam melhores seres humanos. Agradeço a
todos que viveram essa experiência com a gente e digo, com orgulho, que
estamos fazendo teatro para todos – orgulha-se Bruno Fagundes.
Fonte: Rede Globo
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