É muito cruel o que ocorre no Brasil em relação à questão da saúde pública e à pesquisa científica.
A área de saúde brasileira continua recebendo percentual menor de
recursos do governo federal comparado à maioria dos países
desenvolvidos. Até mesmo em países da América do Sul, como a Argentina,
há um grande número de investimentos nessa área.
Um exemplo de como o governo dá pouca importância à saúde, foi a
proibição pelo governador do Estado de São Paulo do Projeto de Lei (PL)
648/2011, que dispõe sobre a constituição de Centros de Referência em
Doenças Raras no Estado de São Paulo, que iria beneficiar milhares de
pessoas com essas doenças. Essa foi uma atitude implacável, pois há no
Brasil 13 milhões de brasileiros com alguma doença rara, que tinham a
expectativa de que esse projeto fosse aprovado.
Esse ano, na Europa, serão aplicados 7 bilhões de euros que serão
destinados a projetos sobre envelhecimento, tecnologias médicas e
doenças raras. Nos EUA, a Casa Branca investe 32 bilhões de dólares nos
Institutos Nacionais de Saúde considerada a maior instituição pública de
pesquisa médica mundial. Enquanto no Brasil, a situação é lastimável
para pessoas doentes, com síndrome ou problemas genéticos raros.
Percebe-se que não há boa vontade política, no sentido de investir em
pesquisas científicas para cura de muitas doenças. Há um consenso dos
pesquisadores brasileiros, no que diz respeito aos entraves que os
impedem de aplicar seus conhecimentos. Veja este depoimento da
geneticista Lygia da Veiga Pereira, do Instituto de Biociências da
Universidade de São Paulo (USP):
“… Muito pior do que a questão orçamentária é a limitação da
burocracia, principalmente na importação de materiais. A gente vive uma
situação meio kafkiana em que tem verba do governo, mas uma boa fatia
desse dinheiro que o governo nos dá ele pega de volta sob a forma de
impostos sobre todos os reagentes importados que a gente precisa. Na
minha área, 90% do que a gente usa é importado. Quando se compra um
material para pesquisa aqui do Brasil, em reais, eles custam três vezes
mais do que se comprássemos lá fora. Mas, o pior ponto é mesmo a
dificuldade que o próprio governo cria para esse material chegar até a
gente. Nos EUA, se preciso de um reagente, no dia seguinte o produto
está na minha mesa. Aqui, perde-se de 30 a 60 dias. Então, além de
pagarmos mais caro, ficamos um tempo de braços cruzados. E o que
acontece? Em 30, 60 dias, um grupo nos EUA consegue testar cinco
hipóteses diferentes. Enquanto isso, a gente está aqui ainda tentando
testar aquela primeira…”. Confira a entrevista completa.
Outros pesquisadores de prestígio acusam: a burocracia e as altas taxas de importação estão estrangulando a ciência do Brasil. “Parece que é tão difícil, ou mais, importar uma medicação ou um material de laboratório, do que um carro. O que é um absurdo”, reclama Mayana Zatz, geneticista da USP. Confira o depoimento da Dra. Zatz na íntegra.
Outros pesquisadores de prestígio acusam: a burocracia e as altas taxas de importação estão estrangulando a ciência do Brasil. “Parece que é tão difícil, ou mais, importar uma medicação ou um material de laboratório, do que um carro. O que é um absurdo”, reclama Mayana Zatz, geneticista da USP. Confira o depoimento da Dra. Zatz na íntegra.
Mas, enquanto o governo brasileiro cobra altos impostos sobre os
reagentes necessários para a pesquisa científica causando atraso nos
resultados e comprometendo o trabalho de nossos pesquisadores, ele é
extremamente generoso com outros setores da sociedade, como por exemplo,
é o caso do neto do ex-automobilista Emerson Fittipaldi, que recebeu R$
1 milhão do governo brasileiro para sua carreira de piloto nos EUA.
Todos sabem que cidadãos brasileiros que têm acesso a esse tipo de
esporte são de famílias que possuem um elevado poder aquisitivo.
Na cultura, temos diversas pessoas beneficiadas pela Lei Rouanet. O
objetivo dessa lei era “educar empresas privadas e cidadãos a investirem
em cultura”. No entanto a lei tomou outro rumo e como no Brasil ainda
prevalece a “Lei de Gérson”, a lei em questão funciona da seguinte
forma: uma determinada empresa devia R$ 100,00 em impostos para o
governo, mas como escolheu um projeto aprovado pela lei Rouanet, ela
destina R$ 6,00 para o projeto e R$ 94,00 para o governo em impostos. Ou
seja, não tirou um único centavo do bolso. Ela vai pagar os mesmos 100
reais que devia com a diferença que ela pode escolher o que foi feito
com os impostos. Coisa que eu e você não podemos fazer! Além disso a
empresa em questão terá propaganda de graça como “patrocinadora” do
projeto. Foi assim que aconteceu com o Banco Bradesco, quando patrocinou
a primeira vinda do Cirque de Soleil ao Brasil. Na verdade, o Bradesco
não gastou nada, pois o dinheiro veio do governo, ou seja, dinheiro
público! Outro exemplo é a cantora Ivete Sangalo que se beneficiou da
mesma lei e conseguiu captar quase 2 milhões de reais para fazer 6 shows
em algumas capitais brasileira. Há também o caso da Maria Bethânia,
Vanessa da Mata e por aí vai… Ou seja, nós somos os verdadeiros
patrocinadores porque o dinheiro é nosso, e ironicamente, não temos
acesso a esses projetos culturais porque são caríssimos.
Não temos nada contra o investimento do governo nessas áreas.
Entretanto, o que não podemos aceitar é que áreas como a saúde pública,
ciência e tecnologia sejam renegadas a segundo plano para beneficiar
projetos de uma minoria que não tem nenhuma necessidade de auxílio.
Enquanto esses projetos são privilegiados, pesquisadores brasileiros,
preocupados com a saúde pública, são obrigados a pagar impostos
altíssimos nas importações de produtos, e sofrem por causa da burocracia
que atrasa o desenvolvimento das pesquisas. E o mais cruel dessa
situação é que por falta de diagnóstico médico, milhares de pessoas que
dependem da descoberta de novos tratamentos para cura de suas doenças
morrem.
Fonte: vidamaislivre.com.br - Colunista Vera Garcia
* Texto escrito em parceria com Mauricio Coppini
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