Com mais de 50 livros publicados e prestando consultoria para diversas
secretarias da educação, o professor Fernando Capovilla, do Instituto de Psicologia (IP) da Universidade de São Paulo (USP),
atua há 25 anos em pesquisas sobre o desenvolvimento e os distúrbios da
linguagem. Neste mês de agosto, o pesquisador lança uma nova edição do
Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngue (Edusp), que traz a
ilustração do significado de cada palavra e a ilustração da forma do
sinal usado em Libras.
Os trabalhos de Capovilla à frente do Laboratório de
Neuropsicolinguística Cognitiva Experimental foram sempre no sentido de
avaliar e intervir, buscando prevenir distúrbios e remediar condições já
existentes – tanto em linguagem oral, como escrita e de sinais.
Os assuntos estudados incluem paralisia cerebral e problemas neurolinguísticos, como dislexia e alexia
(dificuldade para ler causada por lesão cerebral em pessoa que dominava
previamente a leitura). “Nós realizamos pesquisas para descobrir como a
criança pensa, qual a natureza da dificuldade linguística e do que a
criança precisa para ter menos dificuldade, além de treinarmos
professores”, enumera o pesquisador.
Alfabetização eficaz
A escola, como explica, serve como ambiente para que seja possível
comparar o atraso de uma criança em relação à sua turma. Para ter em
mãos uma metodologia ainda mais eficaz de avaliação, os pesquisadores
fizeram um mapeamento completo do português e da Libras. Foram
analisados todos os fonemas, grafemas e fanerolaliemas – leitura
orofacial das palavras – bem como as relações entre eles. O trabalho foi
realizado com o uso de hardware e software desenvolvidos pelo próprio
grupo em parceria com a Fatec.
“Foi o maior e melhor mapeamento de uma língua que já existiu no mundo.
Nós descobrimos qual é exatamente o grau de dificuldade de leitura e de
escrita de qualquer palavra do português durante o primeiro ano de
escolarização da criança”, afirma Capovilla. E deste modo, completa:
“Desvendamos como alfabetizar essas crianças de uma maneira
extraordinária, com um método muito melhor do que esse que é
desenvolvido atualmente e que deixou o Brasil na última posição no
ranking de educação”, disse.
Além de tudo, como ressalta, o método contempla não só ouvintes, como
surdos; e não só crianças sem lesão cerebral, como as com lesão.
Na área de Libras, foram analisados os radicais semânticos, o modo como
os sinais são alterados de acordo com o contexto onde estão inseridos e
os morfemas – unidades mínimas de significado de uma língua. “Em
‘retroprojetor’, estão inseridas as palavras ‘recolher’ e ‘projetar’.
Compreendendo os morfemas de uma língua a pessoa é capaz de decodificar
um sinal”, esclarece o professor.
Crianças surdas, escolas específicas
A partir do mapeamento descrito anteriormente, foram decodificados
todos os morfemas da Libras e desenvolvido um sistema de busca de sinais
que permite resgatar qualquer sinal a partir de seus componentes
formacionais. “Você pode selecionar um mesmo sinal que está presente em
diferentes palavras, como a ‘mão em y’. Então você escolhe ‘palma para
trás’, ‘movimento para trás’, ‘local: queixo’ e aparece o que significa
aquele sinal”, descreve.
Com o método, o professor realizou a pesquisa com mais de nove mil
crianças surdas ao longo de todo o território nacional por cerca de 15
de anos e chegou a resultados com aplicações na área de educação.
Estudando o grau de legibilidade orofacial do português, o grupo
descobriu que uma criança não consegue ler lábios até que esteja
alfabetizada, e que ela se alfabetiza melhor com os significados dos
sinais. Para Capovilla, o dado demonstra que crianças surdas aprendem
melhor em escolas específicas do que em escolas convencionais. “Crianças
surdas não podem ser incluídas em escolas convencionais. 95% das
crianças surdas nascem em lares ouvintes, então elas não aprendem Libras
em casa, elas aprendem na escola. Se é suprimida a escola, elas não têm
Libras”, explica.“O melhor dicionário do mundo”
Neste mês de agosto, Capovilla, em conjunto com a Edusp, lança os dois volumes expandidos da segunda edição do Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngue. “É o melhor dicionário do mundo. Ele traz a ilustração do significado e a ilustração da forma do sinal”, descreve o professor.
O Novo Deit Libras, surgido a partir da aliança com o mapeamento de
Libras e português, foi inicialmente compilado em 1995 e contou com
cerca de mil colaboradores. Sua primeira edição foi lançada em 2009, e
teve distribuição gratuita pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDES) para 70 mil crianças espalhadas pelo país.
A nova edição traz o verbete, a classificação gramatical, a tradução
para o inglês, a definição, a descrição da forma do sinal, a forma de
utilização, a interpretação da natureza dos morfemas, um histórico do
sinal e diferentes sinais utilizados nos estados brasileiros para cada
palavra.
Além da parte linguística, o livro traz um capítulo sobre um novo
paradigma universal de dicionarização da língua de sinais baseado nas
neurociências cognitivas, falando da importância do cerebelo. A obra
conta ainda com um novo capítulo analisando a oralização, a escrita e os
sinais.A intenção do professor é distribuí-la, novamente, pelo FNDES.
“Queremos ajuda da livre-iniciativa, do governo e das ONGs para
atingirmos ainda mais crianças”, salienta.
Por fim, o pesquisador adianta que lançará ainda no próximo ano a
terceira edição do Dicionário, com três volumes expandidos. Capovilla
anuncia, porém, que será seu último trabalho na área. “Não temos mais
fôlego, mas temos certeza de que nosso trabalho será muito bem feito. Os
professores certamente acharão útil e serão capazes de usá-lo em sala
de aula”.
Mais informações: site www.ip.usp.br/lance/, email fcapovilla3@gmail.com, com o professor Fernando César Capovilla.
Fonte: Planeta Universitário
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