Alfabetizada aos 22 anos, a estudante Valdirene Vieira Bonfim, de 37
anos, superou dificuldades com os estudos para fazer as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
A dona de casa sonha em cursar a faculdade de Geografia da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC),
no sul da Bahia. Há sete anos ela tenta conquistar uma vaga no curso
pelo Enem e, nos próximos dias 8 e 9 de novembro, vai tentar mais uma
vez.
"Nasci cega, com glaucoma congênito. Eu me alfabetizei
adulta. Eu fiz a escola normal, já a 7° e 8° séries fiz supletivo.
Terminei o segundo grau com 31 anos. Eu sempre tive vontade de estudar.
Aqui não tinha professores para ensinar o braile. Aí, quando surgiu, em
2009, minha mãe ficou sabendo e comecei a estudar" explica a estudante
de Itabuna, cidade a 426 quilômetros de Salvador.
Para Valdirene, a maior dificuldade com o Enem é estudar. Ela faz um
curso pré-vestibular e conta que não há material para acompanhar os
assuntos.
"Está muito difícil porque o material que o professor dá aula
não está em braile, não tenho com quem estudar, quem possa ler para mim.
Apesar disso, eu acho que a pessoa não pode desistir, tem que continuar
insistindo. Fácil não é. Foi muito difícil concluir o segundo grau,
consegui com apoio da minha família. Quem está estudando hoje está tendo
mais acesso aos conteúdos, pode pesquisar no computador para estudar e
eu ainda não tenho tanto domínio. Ainda preciso de ajuda para usar",
relata.
Para a estudante Luzia Tomaz de Souza, 25 anos, que também é cega e
possui glaucoma congênito, a prova do Enem é o caminho para alcançar o
objetivo de se tornar psicóloga. Ela já fez a prova por dois anos
seguidos, 2009 e 2010, por incentivo da família e dos amigos.
Este ano,
ela irá tentar mais uma vez e já solicitou a ajuda de um ledor para
realização do exame. "A prova é longa, sempre peço em braile e um ledor,
porque fico cansada", diz Luzia.
Moradora de Itabuna, a jovem conseguiu entrar na escola aos seis anos.
"Sempre quis estudar e minha família apoiou. Quero ser psicóloga porque
admiro o trabalho deles. Eles estudam o comportamento humano, acho
interessante o trabalho, a pesquisa", conta Luzia.
Ao contrário de Valdirene, Luzia explica que não tem dificuldade para
estudar, pois acompanha os conteúdos com auxílio do notebook e com
material cedido pela Fundação Regina Cunha, em Itabuna.
Desde 2011, a instituição foi reaberta e funciona dentro de um hospital
na cidade. No local, há uma biblioteca e uma equipe composta por
médicos, fisioterapeutas, psicólogos e educadores físicos para ajudar a
pessoa com deficiência visual a conquistar a independência.
“A pessoa
deficiente visual ou cega, ela só tem capacidade de fazer 10% do que um
vidente faz. Então ele precisa ser treinado, habilitado e ter uma vida
independente”, disse o oftalmologista Ruy Cunha, que atua na fundação.
"Pego o material adaptado emprestado na fundação e trago para casa,
estudo e depois levo de volta. Baixo livros da internet também. No
notebook, assisto aulas online. Estudo mais sozinha. Quando tenho
dúvida, pergunto a alguém que sabe mais do que eu", explica em tom de
brincadeira.
Mesmo fazendo o Enem pela terceira vez, Luzia, assim como Valdirene,
não pensa em desistir.
"A gente precisa tentar. É muito importante a
gente tentar e não podemos parar no tempo. Amigos sempre me dão conselho
me orientam: 'você é inteligente, não pode ficar sem estudar, parada',
essas coisas me incentivam", conclui.
Fonte: G1
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