Pesquisas realizadas em cérebros armazenados no Banco de Encéfalos da
Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) revelam maior prevalência de
demência vascular e doença de pequenos vasos entre idosos, em comparação
com a da doença de Alzheimer.
Os estudos realizados no Banco,
organizado pelo Grupo de Estudos em Envelhecimento Cerebral,
encontraram alterações decorrentes de lesões cerebrais causados por
problemas da circulação sanguínea, compatíveis com o quadro de demência
vascular.
A descoberta pode auxiliar na prevenção da doença, associada a
fatores de risco cardiovascular, como hipertensão e diabetes.
Anteriormente, acreditava-se que a principal causa de demência
entre idosos brasileiros era a doença de Alzheimer, a exemplo do que era
verificado em estudos realizados no exterior.
“A pesquisa avaliou
1.291 casos, sendo que 113 atenderam os critérios para o grupo
‘demência’, e entre os restantes, foram sorteados 100 para o grupo
‘controle’”, diz a professora Lea Grinberg, da FMUSP, que coordenou a
pesquisa.
“Os critérios de inclusão no grupo ‘demência’ foram ter mais
de 50 anos, apresentar demência moderada ou grave e ter doado o cérebro
para o Banco de Encéfalos”.
Os pesquisadores realizaram análises neuropatológicas, que
verificaram a existência de lesões vasculares, tipo infarto ou
arteriosclerose, ou depósitos de proteínas características de doenças
neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson.
“Para isso, usamos
técnicas de imuno-histoquímica”, aponta Lea. “Em todos os casos, os
dados clínicos foram obtidos com os familiares e um grupo de
especialistas analisou os dados para chegar a um diagnóstico clínico”.
Os resultados da pesquisa comprovaram a hipótese de que na população
de São Paulo grande parte dos casos de demências poderiam ter sido
prevenidos se os fatores de risco cardiovasculares, como pressão
arterial, colesterol e obesidade, tivessem sido tratados adequadamente.
“Não existe tratamento para a demência, mas é possível evitar ou
retardar seu aparecimento quando a causa é um problema da circulação
sanguínea”, ressalta a professora.
“Há consciência de que o controle de
fatores de risco vasculares têm impacto positivo na saúde do coração. A
pesquisa mostra que esse efeito pode se estender ao cérebro”.
Biobanco
O Banco de Encéfalos do Grupo de Estudos em Envelhecimento Cerebral da
FMUSP surgiu a partir de um projeto pontual de pesquisa iniciado em
2003, que visava analisar 500 cérebros.
“O objetivo é manter um biobanco
para apoiar a realização de pesquisas sobre envelhecimento e doenças
neurodegenerativas relacionadas”, conta a professora Renata Leite, que
coordena as atividades realizadas no Banco de Encéfalos.
“Atualmente,
estão armazenados cerca de 3.500 cérebros”. Os cérebros são obtidos
junto ao Serviço de Verificação de Óbitos da Capital (SVOC) da USP,
responsável por esclarecer a causa de morte em casos de morte natural
(causas não externas).
As famílias comparecem ao Serviço para reclamar o corpo, procedimento
que envolve a assinatura de documento dando consentimento à autópsia.
Nesse momento, a equipe do Banco de Encéfalos aborda a família para
solicitar a doação do cérebro.
“Uma vez realizada a doação, é feita a
coleta”, relata a professora da FMUSP.
“Parte dos encéfalos é conservada
em formol e a outra é congelada”. O índice de concordância com a doação
é de 94%.
A prioridade é para os cérebros de pessoas com mais de 50
anos, para servir de suporte aos estudos sobre envelhecimento.
A equipe do Banco conta com três pesquisadores-seniores, os
professores da FMUSP, Wilson Jacob Filho (área de Geriatria), Ricardo
Nitrini (Neurologia) e Carlos Augusto Gonçalves Pasqualucci
(Patologia), diretor do SVOC.
Também participam os professores Renata
Ferretti, da Escola de Enfermagem (EE) da USP, que coordena a abordagem
junto às famílias dos doadores, Renata Leite e Lea Grinberg, da área de
Patologia da FMUSP, Claudia Suemoto e José Marcelo Farfel (Geriatria),
além de alunos de iniciação científica e pós-graduação.
O Banco de Encéfalos venceu o 7º Prêmio Inovação Medical Services, na
categoria Ações, em premiação da área de saúde pública realizada pela
empresa Sanofi, no último mês de maio.
O estudo sobre demência vascular é
descrito em artigo da revista Clinics,
assinado por Lea Grinberg, Ricardo Nitrini, Claudia Suemoto, Renata
Ferretti, Renata Leite, José Marcelo Farfel, Erika Santos, Mara Patrícia
Guilhermino de Andrade, Ana Tereza Di Lorenzo Alho, Maria do Carmo
Lima, Katia Oliveira, Edilaine Tampellini, Livia Polichiso, Glaucia
Santos, Roberta Diehl Rodriguez, Kenji Ueda, Carlos Augusto Gonçalves
Pasqualucci e Wilson Jacob-Filho.
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