15 de ago. de 2012

João Pessoa tem baixa notificação de violência contra jovens com deficiência

Criança está abraçando as pernas, sentada no píerEm João Pessoa (PB), são poucos os casos registrados de abuso sexual contra crianças e jovens com deficiência.

Foi identificada apenas uma notificação na Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Violência e Juventude e duas no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).

A pedagoga e pesquisadora Rosângela Régia da Silva também tentou conseguir números sobre o abuso sexual contra crianças e adolescentes com deficiência. Encontrou apenas relatos de pessoas que não puderam, ou não quiseram denunciar o crime às autoridades.

Segundo ela, as famílias têm vergonha de relatar o que aconteceu. Ela cita o exemplo de uma adolescente de 14 anos, que tem paralisia cerebral, vive numa cadeira de rodas e engravidou depois de ter sido abusada sexualmente.

 A família tinha dúvidas se o agressor teria sido algum dos funcionários que trabalhava na casa. Rosângela conta que os pais da jovem são médicos, não denunciaram e realizaram um aborto.

A pesquisadora disse que muitos agentes públicos nem registram se a vítima tem ou não algum tipo de deficiência. Em conversa com u
m delegado, ela chegou a questionar se ele costumava perguntar se a vítima do abuso sexual tinha deficiência, e ele respondeu que pouco importava. “Mas se a pessoa for vulnerável, o crime é duplamente [qualificado]. Nem o delegado tinha pensado sobre isso", lembrou Rosângela.
 
Testemunhas ameaçadas

A subnotificação dos casos tem, entre outras razões, ameaças às testemunhas. "De certa forma, as pessoas eram coibidas a não dizer nada, a concordar com abusos de pais com filhos ou filhas, ou pais que engravidavam as próprias filhas", relata uma ex-funcionária do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), que não quis se identificar.

A delegada-adjunta de repressão aos crimes contra a violência e juventude de João Pessoa, Andrea Melo de Lima, diz que nem a polícia tem condições de garantir proteção ao denunciante.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Exploração Sexual da Câmara fez uma diligência à Paraíba. Os resultados da viagem, ocorrida em junho deste ano, podem ajudar a explicar os poucos casos registrados no estado.

“Segundo os dados oferecidos pelo juiz da Vara de Infância e Juventude da Paraíba, de 200 casos que chegaram pelo Disque 100, só 14 tiveram atendimento no Creas. O que nós estamos percebendo é um nível de atendimento absolutamente precário, então você consolida a vitimização”, lamenta a presidente da CPI, deputada Erika Kokay (PT-DF).

Os dados não são apenas de crianças com deficiência, mas refletem a enorme distância entre a denúncia e registro na rede de proteção, na avaliação da parlamentar.
 
Atendimento pós-denúncia

As deficiências aparecem também no atendimento após a denúncia. A enfermeira Beth Alcoforado trabalha em uma das duas maternidades de João Pessoa que atendem vítimas de violência sexual e contou que uma adolescente com deficiência abusada pelo pai perdeu o direito de interromper a gravidez porque foi levada ao hospital tarde demais.

Ela sugere a criação de medidas para facilitar a comunicação entre os órgãos da rede de proteção. A primeira providência deve ser a identificação dos componentes da rede de atendimento. Em seguida, deve-se abrir um protocolo no qual as unidades estabeleçam comunicação direta, para agilizar a assistência jurídica, social e de saúde.
 
Tabu x educação sexual

A educação sexual para pessoas com deficiência também é fundamental para aumentar a proteção, sem tirar o direito a vivenciar sua sexualidade. Esse trabalho está sendo iniciado na Fundação de Apoio ao Deficiente da Paraíba (Funad). As oficinas são oferecidas aos pais dos usuários e funcionários da instituição, para aprenderem a reconhecer sinais de abuso.

A diretora da Funad, Simone Jordão, defende a qualificação das pessoas que trabalham com crianças e adolescentes com deficiência. “A gente tem que resgatar a capacidade de escuta dos profissionais."


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