A Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de São Paulo realizou uma pesquisa com 109 alunos atendidos pela escola especial
da organização para avaliar o desempenho desses estudantes na transição
para escolas regulares e observou uma melhora de 25% em áreas como a
comunicação, autonomia e socialização.
Segundo a autora da pesquisa e coordenadora pedagógica da Apae de São
Paulo, Roseli Olher, a escola especial que os 109 alunos frequentavam
encerrou suas atividades em 2009, em respeito às então novas diretrizes
educacionais do Ministério da Educação (MEC),
que determinaram a extinção das escolas especiais em turno integral.
A
escola foi transformada em um centro de apoio especializado, que deve
oferecer atendimento duas vezes por semana aos estudantes matriculados
em escolas regulares, no contraturno.
A pesquisa mostra os resultados obtidos pelos 109 alunos nas escolas
regulares. “Durante três anos, eu fui em todas as escolas, observava os
alunos e acompanhava a transição”, diz Roseli.
Os estudantes tiveram
melhoras, de acordo com a pesquisadora, por causa do contato com alunos sem deficiência.
“Convivendo com crianças que falam, pulam e brincam, eles foram
estimulados a ter autonomia, independência, e a fazer contato com os
novos colegas, e por não ter um professor os acompanhando o tempo todo,
eles desenvolveram a capacidade de comunicação”, diz.
Os alunos que participaram da pesquisa tinham deficiências intelectuais de grau leve
(algumas dificuldades pontuais de aprendizado que necessitam de
pequenas adaptações) e moderado (grau de comprometimento maior,
necessitando mais adaptações e mediação maior do professor).
Entre eles,
segundo Roseli, 60% apresentaram mais autonomia, 68% tiveram melhora na
socialização, entre 30% a 50% melhoraram a comunicação e 62% avançaram
na questão curricular.
Na comparação com alunos que permaneceram em
instituições escolares especiais durante o período de transição, nos
aspectos de autonomia e independência não foi registrada melhora, e a
regressão foi de 9%. Durante o período em que foi realizado o estudo, as
escolas especiais ainda estavam em funcionamento.
PNE exige atendimento de escolas públicas
O Plano Nacional de Educação (PNE) de 2010 estabelece
diretrizes e 20 metas para a educação pública no Brasil. O PNE foi
aprovado na Câmara dos Deputados em 2012 mas sofreu alterações no Senado
que o fizeram retroceder para a Câmara, onde ainda aguarda votação.
No artigo 8º, o PNE estabelece que as escolas públicas devem garantir
“o atendimento às necessidades educacionais específicas da educação
especial, assegurando um sistema educacional inclusivo em todo os
níveis, etapas e modalidades”.
A meta de número 4 do PNE, que trata da inclusão de estudantes com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e superdotação,
apresenta entre outras estratégias para efetivar a educação inclusiva, a
ampliação do atendimento educacional especializado complementar para os
alunos que frequentam a rede regular, a reforma de prédios escolares
para que sejam acessíveis aos alunos com deficiência e o incentivo à
educação inclusiva através da articulação do ensino regular e do ensino
especializado.
No Estado de São Paulo, a Secretaria Estadual da Educação optou por
migrar gradativamente os alunos das escolas especiais para a rede
regular, segundo a coordenadora da Gestão da Educação Básica do Estado,
Elizabete Costa.
De acordo com dados da secretaria, São Paulo tem
atualmente 62 mil alunos com deficiência matriculados em classes
regulares na rede estadual. “São alunos com deficiência intelectual,
auditiva, física, surdos, cegos e com transtorno global do
desenvolvimento (autistas em vários graus)”, diz Elizabete.
Autoinclusão
Idely Florence Lelot é mãe de José Francisco, o Zeca, que hoje tem 27 anos. Zeca tem síndrome de Down
e sempre estudou em escolas regulares. “Ele sempre foi autossuficiente,
hoje tem autonomia para ir e voltar do trabalho sozinho”, diz.
Idely tem duas outras filhas mais velhas, e quando chegou a hora de
Zeca ir para a escola, ela achou que não tinha que ser diferente.
“Quando ele entrou na escola, não existia a palavra inclusão”, diz. Ela
optou por uma escola particular, com um método pedagógico diferenciado,
sem foco na avaliação. No ensino médio, Zeca passou para uma escola
pública. “No ensino médio da escola particular, ele iria estudar em uma
classe separada, e eu não concordei”, diz. Para Idely, “a inclusão
começa com a autoinclusão". Meu filho é aceito porque sempre se inseriu,
como qualquer outra criança”, declara.
Quando a adaptação é difícil
Gonçala Mendes do Amaral é mãe de Mateus, 15 anos. Ele tem síndrome de Down e estudava na escola especial da Apae de São Paulo desde que tinha 1 ano e meio. Mateus foi um dos alunos acompanhados pela pesquisa de Roseli. Gonçala conta que o filho não se adaptou à escola regular. “Até hoje me ligam para ir buscar ele, porque não quer ficar até o fim da aula”, diz.
Ainda segundo a mãe, Mateus adaptou-se às outras crianças, mas o método
é a maior dificuldade: “ele não aprendeu a ler e nem a escrever, e como
todas as atividades são de escrita, ele fica sem fazer nada”.
O menino
sente falta das atividades que realizava na Apae e, às vezes, pede para
voltar para a escola antiga. “Ele até se anima para ir para a escola
regular, mas não consegue acompanhar.
Na Apae, o foco não era só na
escrita, tinham brincadeiras, passeios, e ele participava”. A mãe diz
que frequenta as reuniões na escola de Mateus, mas nenhum professor lhe
diz nada sobre o desenvolvimento dele. “O foco deles é com os que
aprendem”, diz.
“A educação inclusiva é uma mudança de mentalidade da sociedade”, diz
Roseli. “Está posta e não vai voltar atrás. Eles são pessoas que podem
aprender se estimulados, e as medidas aplicadas para o aluno especial
podem ser usadas com todos os alunos, e não só com as pessoas com
deficiência”, explica.
Segundo Roseli, o preconceito diminuiu bastante, e
hoje os professores entendem que é um direito do aluno com deficiência e
pedem ajuda para aprender a trabalhar com ele. "Antes, eles
simplesmente não aceitavam o aluno”.
A pesquisadora chama a atenção para
a importância dos professores de se capacitarem e de um ambiente
estruturado e adaptado para o trabalho "em benefício de todos os alunos,
e não só do aluno com deficiência”.
Capacitação gratuita
Para preparar os professores para trabalhar com os alunos com deficiência nas classes regulares, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, em parceria com a Universidade Estadual Paulista (UNESP),
está oferecendo gratuitamente um curso de especialização para os
professores da rede estadual.
As aulas começaram no dia 12 de março, e é
a primeira vez que o Estado oferece um curso de especialização para
seus docentes. Capacitações em algumas áreas são oferecidas pelo Centro
de Apoio Pedagógico Especializado (CAPE), mas não cursos mais rápidos e
não oferecem certificado aos concluintes.
A coordenadora do curso da UNESP, Renata Portela Rinaldi, diz que serão
oferecidos dois cursos: um para professores e gestores de escolas, que
vai fornecer conceitos sobre a educação inclusiva, fundamentos de
metodologia, apresentar as principais alternativas pedagógicas e
recursos materiais, aprendendo como utilizá-los.
O outro curso será
oferecido para os professores que vão trabalhar nas salas de recurso da
rede estadual e que, durante o curso, vão poder optar pela
especialização em um tipo de deficiência, além de atuar como
orientadores dos professores da classe regular.
“O currículo foi pensado
para articular com o local de trabalho do professor, para que ele possa
atender com qualidade e, se precisar de suporte, contar com o apoio
especializado do professor da sala de recurso”, diz.
A rede estadual de educação de São Paulo tem 230 mil professores.
Segundo Elizabete, os cursos de especialização em parceria com a Unesp
vão oferecer 1600 vagas, e 17 mil professores estão interessados em
fazer o curso. As aulas serão nos polos da Unesp distribuídos em todo o
Estado, com atividades presenciais e a distância.
Segundo a coordenadora do curso, “a Unesp reuniu professores
especialistas na área da inclusão voltada para a prática em sala de
aula”.
O objetivo é de ampliar a oferta de vagas. O curso será gratuito,
mas o aluno que deixar de frequentar as aulas depois de 30 dias terá de
restituir o Estado pela desistência.
Renata observa que, na formação
inicial na pedagogia e nas licenciaturas, desde 2005, é obrigatório o
ensino de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) e da educação inclusiva,
mas o número de horas sobre esses temas depende de cada universidade.
"A
formação inicial não dá conta de tudo o que o professor precisa saber”,
diz Renata.
Fonte: Terra Educação
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