15 de mar. de 2013

Só 5% das crianças com deficiência que entram na escola chegam ao ensino médio

Estudante com deficiência visual lê com ajuda de lupa 
Professores despreparados e escolas sem acessibilidade arquitetônica e pedagógica estão entre as principais causas da evasão escolar entre alunos com algum tipo de deficiência – bem superior que a dos demais. 

Dados de 2010 do Censo Escolar do Ministério da Educação (MEC) mostram que havia 69.441 dessas crianças matriculadas no ensino infantil (0 a 5 anos) oferecido em escolas especiais e regulares. No ensino fundamental (1° ao 9º ano), eram 522.978. Já no ensino médio o número era drasticamente menor: 28.667.

“A queda na taxa de matrículas indica que a qualidade da educação é ainda menor para essa população, fazendo com que a exclusão e a evasão sejam as maiores”, disse Enicéia Gonçalves Mendes, coordenadora do programa de extensão em formação continuada da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e presidenta da Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial.

Segundo ela, embora já existam leis que determinam a adequação de espaços públicos às diferentes necessidades, a falta de acessibilidade ainda é um grande problema. Dados do MEC mostram que das mais de 146 mil escolas de ensino fundamental, apenas 35 mil estavam adaptadas na época do levantamento, sendo que 29 mil não tinham sequer sanitário adequado e 4.600 não tinham nenhuma de suas dependências adaptadas.

Imprescindíveis para atender às necessidades básicas desses estudantes, a construção de rampas, vias de acesso, banheiros adaptados e a instalação de elevadores são insuficientes. "Há ainda barreiras atitudinais (atitudes baseadas na desinformação, no preconceito), obstáculos sociais e pedagógicos que dificultam o aprendizado”, disse.

Entre os obstáculos pedagógicos ela destaca a formação precária dos professores, geralmente em cursos à distância com muitos problemas estruturais – que dificulta a educação de todos os alunos –, as turmas numerosas, a falta de auxiliares em sala de aula também treinados adequadamente e deficiências nos currículos e nos materiais didáticos. “A criança passa 5 horas por dia, 5 dias por semana na sala de aula, mas encontra barreiras. O ensino não é adaptado às suas necessidades, o professor não sabe como ajustar o ensino àquela realidade e ela acaba não se beneficiando desse ensino em classe comum.”

De acordo com Enicéia, em países com políticas mais avançadas os professores do ensino regular têm formação adequada e trabalham em dupla com professores especialistas em ensino especial, em salas que contam com todos os recursos, com excelentes resultados no aprendizado.

Outro entrave ao desenvolvimento escolar é o uso inadequado de tecnologias criadas para beneficiar o aprendizado dos estudantes com deficiência. A professora explicou que além de incentivar as matrículas desses alunos no ensino regular – que devem frequentar cursos específicos no contraturno –, o MEC tem financiado recursos multifuncionais para escolas com alunos com deficiência matriculados. 

Na prática são salas com mobiliário e materiais pedagógicos especiais, como lupas, calculadora sonora, caderno de pauta ampliada, engrossadores de lápis e pincéis, suporte para livro, tesoura adaptada, programas de computadores, brinquedos e outras ferramentas para dar suporte ao processo de aprendizado.

No entanto, conforme Enicéia, nem sempre esse serviço funciona como deveria. Muitas vezes o atendimento é de no máximo duas horas por semana, tempo insuficiente para satisfazer as necessidades de crianças com atrasos graves de desenvolvimento. “Antes de ser alfabetizada, de ir para uma classe comum, uma criança surda tem de desenvolver a linguagem desde pequenina; assim como tem de aprender libras aquela que não fala”, disse.

Há ainda um outro complicador: como os serviços públicos de saúde e educação não oferecem atendimento para a estimulação precoce – emprego de diversas técnicas e terapias que atenuam limitações de muitas deficiências –, esses estudantes já chegam defasados numa escola regular cheia de problemas. "Se houvesse esse trabalho desde os primeiros meses de vida, uma criança com paralisia cerebral ou deficiência física severa já poderia estar usando recursos de tecnologia assistida, computadores especiais, e teria condições de ser alfabetizada. No entanto, em geral a criança só vai ter acesso quando entrar numa escola equipada com esses recursos e estará defasada em relação aos colegas."

Para Enicéia, os alunos que chegam ao ensino médio são grandes vitoriosos que aprenderam sozinhos, sem o apoio necessário. Não é à toa que depois da defasagem e de seguidas reprovações a maioria das crianças com deficiência acaba em salas do Educação de Jovens e Adultos (EJA) – isso quando não abandona a escola.

Foto: Rosângela Machado / MEC

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