Nick Johson se
lembra bem do exato momento em que perdeu seu olfato. Era 9 de janeiro
de 2014 e ele jogava hóquei com amigos em um lago congelado perto da
casa de seus pais, em Collegeville, na Pensilvânia (EUA).
"Estava patinando para trás, devagar, mas tropecei. Bati o lado direito da minha cabeça no chão e desmaiei", conta."Acordei na ambulância, com mil pessoas à minha volta e sangue saindo pela orelha."
Johnson, de 34
anos, sofreu uma perfuração no tímpano e fraturou o crânio em três
lugares. Teve hemorragia cerebral e convulsões.
Após uma
recuperação de seis semanas, ele voltou ao trabalho como gerente de
vendas de uma grande cervejaria.
Durante uma reunião de apresentação de
um novo produto, Johnson percebeu que não conseguia distinguir os aromas
dos quais seus colegas estavam falando. "Foi aí que a ficha caiu", diz.
Perda de experiências
O
ser humano não costuma estar entre os melhores farejadores da natureza,
principalmente em comparação com outros animais. Mas pesquisas mostram
que os odores têm uma forte influência subconsicente em nossos
pensamentos e comportamentos.
Pessoas que, como Johnson, perderam o
olfato após um acidente ou uma doença contam sentir uma enorme perda,
com impacto que eles nunca imaginaram.
Perder a capacidade de saborear alimentos e bebidas é
uma das principais queixas desses pacientes. Os gostos doce, salgado,
azedo e amargo são sentidos com a língua. Mas sabores mais complexos
também dependem do olfato.
E, para Johnson e para outras pessoas
como ele, há uma outra categoria de perda. Quando sofreu seu acidente,
ele estava prestes a ser pai pela segunda vez, de uma menina.
"Eu brinco que não sinto o cheiro da fralda da minha filha, mas a verdade é que não sinto nenhum cheiro dela. Não tenho a mesma sensação que tinha quando meu filho era bebê", conta.
Interrupção de sinais
Cientistas
estimam que a porcentagem de pessoas incapazes de sentir odores é
pequena. Uma causa comum para o problema é a sinusite crônica,
principalmente entre os mais jovens.
O fato de nossos neurônios
olfativos chegarem até as narinas também é um complicador, pois eles
estão mais expostos a danos por toxinas e infecções.
Outras
pessoas costumam sentir uma perda temporária do olfato por causa de
resfriados ou outras infecções virais. Mas, quando chegamos aos 70 ou
80, a maioria de nós experimenta uma deterioração significativa.
Apesar
de o sistema olfativo ter a capacidade de se regenerar, com a idade esse
processo fica mais lento.
No caso de Johnson, a causa foi
provavelmente um dano catastrófico a seus neurônios receptores
olfativos. Essas células vão do nariz ao cérebro passando por uma fina
estrutura óssea em forma de peneira.
Quando o americano bateu a
cabeça no gelo, o movimento repentino de seu cérebro dentro do crânio
pode ter esmagado ou rompido essa retícula, impedindo os sinais de serem
transmitidos do nariz ao cérebro.
O mecanismo do olfato
Johnson
aspira fundo seu copo de Nugget Nectar, que era sua cerveja favorita.
As substâncias químicas voláteis presentes no líquido viajam pelas
narinas até o teto da cavidade nasal, a parte especializada no olfato.
Ao sorver um gole, essas mesmas substâncias passam do fundo da boca para a mesma parte do nariz. Até aí, tudo bem.
A
seguir, as moléculas são absorvidas no muco dentro do nariz. É nesse
momento que se forma o odor: as moléculas precisam ser dissolvidas nesse
muco para serem detectadas.
Para uma pessoa saudável, o que
acontece em seguida é apenas parcialmente entendido pela ciência. As
pontas dos receptores olfativos ficam à espreita nesse muco, ligando-se
diretamente ao cérebro.
Temos milhões dessas células, mas elas são
de apenas 400 tipos, cada um capaz de se ligar a uma molécula
específica.
Com base em um padrão de ativação desses receptores, ao
cheirar a Nugget Nectar, uma pessoa é capaz de reconhecê-la como sendo
"cerveja".
Johnson não sente nada porque seu cérebro não recebe as informações vindas de sua bebida.
Potencial pouco explorado
Até
pouco tempo atrás, cientistas acreditavam que o ser humano poderia
detectar apenas 10 mil odores diferentes. Mas, segundo Joel Mainland, do
Monell Chemical Senses Centre, instituto especializado em pesquisas
sobre olfato e paladar, hoje já se pensa de maneira diferente.
Um artigo
recente na mostra que poderíamos perceber mais de 1 trilhão de aromas.
Johnson
agora está sendo tratado neste centro na Filadélfia, onde é submetido a
um treinamento sensorial que busca melhorar seu olfato e seu paladar.
Mainland acredita que todos nós temos um potencial para sermos melhores
farejadores se formos devidamente treinados.
Um bom motivo para
melhorar nosso olfato seria ajudar-nos a melhorar nossas relações.
Segundo Mainland, algumas pessoas que nasceram sem a capacidade de
sentir odores costumam ter problemas para identificar o estado emocional
de outras.
Pesquisadores também descobriram que aromas podem
mudar nosso humor e comportamento.
George Preti, também do Monell, e
seus colegas descobriram que extratos de odores da axila masculina
alteram os níveis hormonais das mulheres e as ajudam a se sentir mais
relaxadas, por exemplo.
Para pacientes como Johnson, ainda há
muito a ser feito para que ele recobre seus sentidos.
Uma das
recomendações é de que ele cheire várias coisas diferentes algumas vezes
por dia, pois há indícios de que isso estimula o sistema olfativo.
Mas,
no futuro, é possível que casos como o dele sejam resolvidos mais
rapidamente. Uma equipe do Monell está fazendo experiências com
células-tronco nasais, na expectativa de que possam transformá-las em
neurônios que possam substituir aqueles que foram danificados
Fonte: BBC-Brasil
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