Quebrar paradigmas e propôr uma nova maneira de se relacionar com a alimentação é a proposta do novo Guia para a População Brasileira,
uma parceria do Ministério da Saúde com a Organização Pan-Americana de
Saúde (OPAS) e o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde
(Nupens), Núcleo de Apoio à Pesquisa (NAP) vinculado à Pró-Reitoria de
Pesquisa da USP, localizado na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP.
Em sua segunda edição, o Guia busca inovar e se atualizar
em relação ao primeiro, lançado em 2006 — sem a participação do Nupens
—, fazendo uma ampla análise da alimentação do brasileiro.
Além da parte
nutricional, levou-se em conta questões culturais, sociais e até
ambientais, inovando no conceito de guia alimentar e explorando os
alimentos além dos seus nutrientes.
Uma das principais propostas do novo guia é mudar o
conceito de alimentos como “carregadores de nutrientes”, pois não é o
suficiente para explicar toda a relação entre comer — e seus desfechos
para a saúde da população.
Segundo a nutricionista Maria Laura Louzada,
pesquisadora do Nupens e participante na elaboração do Guia, um alimento
não é só uma soma de nutrientes: “A maioria dos guias recomenda: coma
mais vitamina C, mas uma laranja não é só vitamina C”, exemplifica.
Ela
cita também que, com a Revolução Industrial, tentou-se formular
alimentos artificiais baseados em soma de nutrientes existentes em
produtos naturais, sem sucesso.
Com base nessa complexidade de
nutrientes e de suas relações nos alimentos, buscou-se no livro uma
mudança na proposta de uma alimentação mais saudável.
Muito além da comida
O novo guia também relaciona a alimentação com questões
culturais e sociais, focado na própria população brasileira.
Foi
estudado um inquérito do IBGE, que analisou o comportamento alimentar de
mais de 30 milhões de brasileiros, de várias regiões e classes de
renda, para tentar relacionar o que as pessoas já comem com o ideal.
Percebeu-se que muitas pessoas já têm uma alimentação saudável e
balanceada.
O livro foca em refeições ideais baseadas na realidade
cultural do País, diversificando os tipos de alimentos e citando pratos
regionais, como pão de queijo e tapioca, para abranger o maior número de
pessoas possível e ser tangível à realidade da população.
Indo além da questão do alimento em si, o livro também
trata da alimentação como uma simbologia, que vai desde o que se come
até o local, as companhias e questões sociais.
O guia recomenda que se
coma em um lugar adequado e especial para tal (evitando o chamado mindless eating,
que seria, de acordo com Maria Laura, uma alimentação sem foco e que
acaba sendo excessiva, sem a percepção de quem come).
Além disso,
alimentar-se preferencialmente em companhia e cozinhando os alimentos
(evitando os chamados “alimentos ultraprocessados”) é considerada a
melhor opção.
O ato de preparar os alimentos envolve questões históricas
e de gênero, da estigmatização da mulher na cozinha e de sua maior
entrada no mercado de trabalho, além da imagem negativa do ato de se
cozinhar: “a culinária só vai funcionar se ela for resignificada, se
parar de ser um fardo e uma obrigação e for uma atividade de prazer e
divertimento, partilhada entre todos os moradores da casa”, cita a
pesquisadora.
O novo Guia, ao buscar representar o brasileiro em sua
pluralidade, aborda desde questões culturais e sociais até a relação
entre o que está no prato e o meio ambiente: “alimentação não é só
comer”, reforça Maria Laura.
Evitar comer alimentos chamados
“ultraprocessados”, que geram maior impacto ambiental, e consumir mais
produtos in natura, especialmente vegetais orgânicos, são recomendações citadas pela doutoranda.
Veja abaixo o infográfico resume os quatro tipos de alimentos abordados no Guia, com suas especificações e consumo recomendados.
Os alimentos com produção agroecológica — que valoriza o
trabalhador do campo e a agricultura policultora e familiar — também
devem ser priorizados.
Não obstante, o livro também relaciona a
alimentação com políticas públicas, que vai desde transporte urbano (uma
pessoa que demora muito para se locomover muitas vezes não tem
disposição para cozinhar e acaba prejudicando a qualidade de sua
alimentação), até custo de alimentos e concessão de subsídios agrícolas,
envolvendo o agribussiness, a monocultura exportadora e o lobby de semestres geneticamente modificadas.
Abordando as mais diversas áreas do conhecimento, com
estudos não tradicionais, populacionais e com observações de evolução
histórica e de saberes populares, o novo Guia Alimentar para a População Brasileira
procura unir toda a heterogeneidade do País, baseando-se em oficinas
com estudiosos das mais diversas áreas da saúde e de outros campos do
conhecimento e contando com o apoio de jornalistas para criar uma
linguagem mais acessível ao público em geral.
Com traduções em inglês e
espanhol, outros países podem se inspirar nessa nova proposta e
abordagem da alimentação de um país, principalmente para a América
Latina, com raízes históricas, culturais e sociais semelhantes às
brasileiras.
Fonte:Agência USP de Notícia
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