Uma adoção mudou o rumo de uma família em Cuiabá, em Mato Grosso, e de um bebê indígena que estava fadado desde as primeiras horas de vida a ser sacrificado por ter nascido com Síndrome de Down.
Quando se lembra do esforço que precisou ter para ser mãe adotiva do
pequeno Antônio, hoje com sete anos, a psicopedagoga Beatriz Mello, de
56 anos, diz que faria tudo de novo só para ter a chance de salvar a
vida do filho que é da etnia Cinta Larga.
“Foi uma escolha muito forte. Até pela minha formação eu sempre desejei
ser mãe de uma criança com Down. Eu fiz dar espaço para isso e recebi o
meu maior presente, um ‘pacotinho especial’ que me dá alegria
diariamente”, diz Mello.
O ‘pacotinho especial’ de Beatriz vem ao longo dos anos contrariando as
previsões médicas mais pessimistas. Além de ser Down, Antônio é surdo e,
por consequência, não fala e tem respiração limitada devido a um
problema pulmonar grave.
Há um ano, ele recebeu um implante de um aparelho no ouvido
e já começa a reproduzir na fala os sons que ouve.
Beatriz contou que
se emocionou quando observou o filho se esforçando para falar a palavra
mamãe. “Ele falou ma, ma, ma. Foi uma emoção muito grande”, recorda.
Superação
Os quatro primeiros anos de vida do garoto não foram fáceis. Antônio
passava meses internado. Beatriz diz que o esforço, na época, era para
mantê-lo vivo.
Ela se emociona quando recorda do momento mais difícil
quando pensou que Antônio não sobreviveria a mais um período no
hospital. Em Maceió, a capital de Alagoas, o rim e o fígado de Antônio
entraram em colapso.
“Eu disse bem próxima ao ouvido dele que se ele tivesse que nos deixar,
a passagem dele
seria iluminada. Mas que se ele quisesse ficar com a
gente, ele receberia muito amor”, afirma.
Antônio saiu do coma e, um mês depois, deixou o hospital. “Ele optou
pela vida sempre sorrindo, com bom humor. Meu filho é um guerreiro”,
completa Beatriz.
Mãe de outras três filhas, a psicopedagoga conheceu a história do bebê
que se tornaria o filho caçula dela por meio de uma reportagem exibida
em 2005 pela TV Centro América, afiliada da Rede Globo em Mato Grosso.
Nà
época, Antônio estava debilitado e precisava fazer uma cirurgia. Ele
era o 12º filho de um casal de índios que vivia em uma aldeia localizada
na zona rural de Aripuanã, cidade distante a 976 quilômetros de Cuiabá.
A mãe biológica do garoto temendo que o filho pudesse ser sacrificado
por conta da deficiência contrariou a tradição e entregou o menino para a
Fundação Nacional do Índio (Funai).
“Essa mulher foi muito corajosa porque ela sabia que se ele ficasse por
lá não sobreviveria até pelas condições da aldeia que não tinha nem
energia elétrica”, revela Beatriz.
Da chegada de Antônio a Cuiabá para o primeiro tratamento médico até
obter a guarda provisória dele foram dois meses de espera, conta
Beatriz.
Ele foi levado para a casa dela ainda debilitado e recebendo
cuidados em uma ‘homecare’. A guarda definitiva só foi expedida quatro
anos depois.
Da convivência com o filho especial, diz Beatriz, ela aprendeu a ser
mais serena e forte. “O meu crescimento como pessoa é incrível. Eu
sempre achei que faltava em mim o dom da paciência. Depois do Antônio me
tornei mais tolerante e serena. Os valores que a gente têm na vida
mudam, não tem jeito. Acasos acontecem por conta de um acaso ainda
maior”, revela.
Antônio ainda continua cercado de cuidados por ter uma saúde frágil. Ele faz fisioterapia respiratória duas
vezes por dia e ainda está aprendendo a se comunicar com o auxílio de
uma fonoaudióloga. A meta de Beatriz é tornar o filho o mais
independente possível.
Cinta Larga
Os índios da etnia Cinta Larga estão espalhados em aldeias pelos estados de Mato Grosso e Rondônia.
Dados da Funai apontam que a etnia possui 1.757 integrantes. A comitiva
do Marechal Cândido Rondon foi a primeira a fazer contato com os Cinta
Larga, em 1915. A intensa pressão econômica na região em que está
inserida por conta da atividade garimpeira fez a população da etnia
reduzir consideravelmente ao longo dos anos.
Fonte: G1
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