Há quase dez anos, Rute Mielniczki se dedica integralmente a uma missão: traduzir o mundo para pessoas com deficiência auditiva
através dos gestos.
Ela não tinha nenhum familiar surdo, nem conhecia
alguém que enfrentasse as dificuldades que uma pessoa que não escuta
enfrenta, mas foi um encontro, ao acaso, que fez Rute se dedicar à
profissão de intérprete de Libras, uma decisão que mudou sua vida e a de muitas pessoas.
Nascida em Curitiba,
Rute conta que assim que chegou em Joinville, em 2004, foi a uma
igreja, onde estava acontecendo uma apresentação de um grupo teatral
missionário de João Pessoa. Na ocasião, eles apresentaram um jogral em
Libras, a Língua Brasileira de Sinais.
— Quando a apresentação terminou, percebi que um senhor estava chorando
muito, e fui falar com ele. O senhor contou que já frequentava a igreja
há três anos, mas como era surdo, era a primeira vez que ele de fato
estava entendo o que acontecia, e se emocionou com a mensagem —, lembra.
Tomada por aquela emoção, Rute se interessou pelo assunto, e começou a aprender a linguagem de sinais já no dia seguinte.
— O senhor me deu uma apostila, e comecei a estudar. Isso tinha
acontecido numa quinta, e no domingo eu já comecei a interpretar a missa
para ele —, relata.
Autodidata, Rute começou a aprender sozinha.
— Colei as páginas da apostila pela parede da casa.
Mais tarde, ela procurou se aprimorar, participando de cursos e
fazendo uma pós-graduação em biolinguística, em Curitiba. Foi lá que ela
também encontrou materiais para poder replicar este conhecimento para
outras pessoas.
Atualmente, ela ministra aulas gratuitas de Libras no Instituto Joinvilense de Assistência aos Surdos e na Escola do Legislativo da Câmara de Vereadores, onde ela também realiza a tradução simultânea das sessões solenes.
— É muito gratificante perceber que muitos surdos estão conhecendo
seus direitos, como cidadão, através do nosso trabalho —, diz.
— Muitos me procuram, para falar com os vereadores sobre os problemas
do bairro ou reclamar da falta de interpretes nas escolas e faculdades,
por exemplo —, relata.
— Além disso, é muito legal perceber que muitos passaram a assistir a
TV Câmara, até porque é hoje o único canal com a tradução na linguagem
dos sinais —, ressalta.
Outra realização de Rute tem sido trabalhar como intérprete no Festival de Dança.
— Há três anos já realizo esse trabalho —, diz, orgulhosa.
Mas Rute não se limita a traduzir em sinais o que os surdos precisam
"ouvir" ou "falar". Mais do que uma mediadora, ela se transformou uma
militante da causa e já obteve grandes conquistas. Graças ao esforço de
Rute, muitos surdos já tiveram acesso a um direito básico, como passar
pela autoescola e prestar a prova do Detran
para conseguir a carteira de habilitação.
É também graças ao trabalho
voluntário de Rute junto aos órgãos públicos (que deveriam, por lei,
oferecer um intérprete), que muitos surdos puderam receber atendimento
médico, passar por uma cirurgia ou fazer uma queixa na delegacia. E
recentemente, ela está engajada em outra causa: a alfabetização de
pessoas surdas.
— Este mês, será inaugurada a primeira Casa Brasil Bilíngue —, antecipa.
O espaço para crianças, adolescentes e adultos, pessoas de todas as
idades, surdas ou não, oferecerá desde a alfabetização em Libras para
crianças de um a seis anos, até adultos, em busca de cursos
profissionalizantes para ingressar no mercado de trabalho.
— É triste pensar Joinville em 20 mil surdos, e que muitos chegam a
fase adulta sem saber ler e escrever. Mais triste ainda é pensar que
muitas crianças surdas passam a primeira infância sem se comunicar,
porque até chegarem à escola, a família não se interessou em aprender ou
teve acesso à Libras. Foi pensando nisso que desenvolvemos esse
projeto piloto —, justifica.
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