A legislação brasileira é clara: todos tem direito à educação.
No entanto, famílias como as de Bruno, Paulo, David e Marina enfrentam
desafios para garantir que seus filhos se matriculem ou se mantenham na
rede pública de ensino em Fortaleza pelo simples fato de serem pessoas com algum tipo de deficiência.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Censo 2010, revelam dados alarmantes: dos 78,5 mil crianças e adolescentes, entre zero e 17 anos, com deficiências, apenas 2,6 mil, ou seja, 3,31%, estão na sala de aula na Capital. É certo que houve avanços, diz o Instituto com relação à capacitação de profissionais.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Censo 2010, revelam dados alarmantes: dos 78,5 mil crianças e adolescentes, entre zero e 17 anos, com deficiências, apenas 2,6 mil, ou seja, 3,31%, estão na sala de aula na Capital. É certo que houve avanços, diz o Instituto com relação à capacitação de profissionais.
Há mais recursos e instalações adequadas das escolas
municipais, mas é preciso superar preconceitos e a falta de informação
até das próprias famílias.
Para os pais de Bruno, de nove anos, Jéssica e Henrique Viana, a luta é constante. O garoto é autista
e não conseguiu ainda "parar" em nenhuma escola regular. "No início do
ano letivo, a gente procura uma escola que diz ter vaga e quando
informamos o diagnóstico de Bruno, as portas se fecham. Ele não sabe
ler, mas é inteligente", conta a mãe do menino.
As histórias de Paulo e Marina se assemelham às de Bruno. Também estão
fora da sala de aula. O primeiro, de dez anos, tem deficiência múltipla.
Já a menina, de sete anos, também é autista. "Vamos aguardar as
matrículas desse ano", afirma o pai de Marina, Saulo Pereira.
Para eles, os desafios que permeiam a educação inclusiva
vão além das garantias legais de acesso. E têm razão. Além das
instituições que atuam com pessoas com deficiência, o Governo do Estado
mantém o Portal Ceará Acessível com informações e serviços sobre mercado de trabalho, educação, saúde, lazer, cultura, esporte e acessibilidade.
A Prefeitura de Fortaleza possui o programa Diferenciarte, que capacita
pessoas com deficiência e suas famílias. "Temos as leis, temos apoio de
entidades e do poder público e qual a razão para tanta luta?",
questiona Saulo.
Na avaliação da socióloga, Selma Alves, a sociedade está apenas
começando a entender e aceitar as diferenças e cabe à famílias não mais
tratar o filho, filha ou parente com deficiência como "ente de vidro" e
que pode se quebrar a qualquer momento.
Quando a criança com
deficiência, diz, deixa de ser vista pelo seu déficit e passa a ser
entendida como uma pessoa integral, plena de significado, decorrem desse
novo olhar atitudes e posturas que possibilitarão o desenvolvimento
global. "Além de cumprir simplesmente a lei, as escolas precisam se
reinventar e derrubar clichês", analisa.
E foi lutando contra ideias ultrapassadas e estereotipadas, que
avaliavam seu filho, David, de 16 anos, como incapaz de estar numa sala
de aula, que Keyla Chaves, hoje, comemora a vitória de vê-lo na 6ª série
do Ensino Fundamental. "Ele não fala, tem dificuldades motoras e não
tem diagnóstico fechado, mas nem por isso, o deixei em casa, invisível
para a sociedade".
A jurista Cláudia Saraiva reafirma que negar ou fazer cessar matrícula
por motivo de deficiência é crime. "Cabe a escola cumprir a lei e mais
do que isso: deve oferecer recursos, tecnologias e pessoal capacitado",
pontua.
Onde denunciar
Promotoria de Justiça do Idoso e Pessoa com Deficiência - Rua Assunção, 1.242 - José Bonifácio - Fones : 3252-6352 ou 3252-6391
Defensoria Pública - 3101-3419
Panorama
646 mil pessoas com deficiência vivem em Fortaleza. Desse total, 78,5
mil são crianças e jovens de zero a 17 anos que têm direitos assegurados
por leis
OPINIÃO DO ESPECIALISTA
Família e inclusão
Sônia Oliveira
Diretora de Direitos Humanos e Inclusão da Casa da Esperança
Diretora de Direitos Humanos e Inclusão da Casa da Esperança
Em última instância, inclusão é uma decisão da família. Sim, estudar na
escola regular é um direito constitucional da criança com deficiência,
que deve ser garantido pela família, estado e sociedade. Mas no final
das contas, é uma decisão da família. Não tem sido fácil para os pais
tomarem essa decisão e garantir esse direito.
Uma das grandes
dificuldades para a família é superar o sentimento de proteção, o temor
da exposição, o medo que o filho não consiga se defender das outras
crianças. Esse sentimento não é exclusivo de pais de crianças com
deficiência.
De uma maneira geral, pais e mães ficam apreensivos e
temerosos ao levarem seus filhos à escola pela primeira vez. Com medo do
filho não se adaptar à sala de aula, ao professor aos colegas, enfim às
regras estabelecidas pela escola, ou se serão bem sucedidos nas
tarefas, no aprendizado da leitura e da escrita etc.
De fato, em muitas escolas, o modelo de normalização proposto, que se
distingue de uma sociedade que cada vez mais tem a diversidade como um
valor, acaba evidenciando as dificuldades que algumas crianças têm de se
enquadrar, pois exige que todos os alunos se comportem e cumpram um
protocolo de aprendizagem padrão.
Este modelo de ensino, anacrônico e conservador, vem sendo cada vez
mais colocado em xeque com a presença dos alunos com deficiência. Um
fato é inegável: as mudanças necessárias para a inclusão só irão
acontecer com a presença de crianças com deficiência dentro das escolas.
Quando tomam a decisão de matricular seus filhos na escola regular,
começa então a peregrinação da família. Muitas portas fechadas, muitas
negativas, muita "falta de condições". Imagine a fragilidade desses pais
nesse momento, quando a sociedade fecha a porta para seus filhos em
função de sua deficiência.
Por isso, as famílias precisam estar firmes para defender os direitos
de seus filhos e conscientes da importância deles fazerem parte da
comunidade escolar, para o próprio desenvolvimento e dos outros alunos
da escola. Nós só teremos uma sociedade inclusiva, de fato, se a
educação for inclusiva formando pessoas inclusivas.
Há muitas leis que
garantem a matrícula, a permanência, a adaptação da escola e do conteúdo
para que não discriminem alunos com deficiência. No momento da
matrícula a coisa mais importante é o diálogo dos pais com os gestores e
professores, e agora não estamos mais falando da instituição escola e
sim de pessoas.
Os profissionais da educação também precisam estar conscientes dos
direitos das pessoas com deficiência e dos benefícios que a inclusão
traz para escola como um todo; compreender a inclusão como um processo
em evolução, no qual o papel que irão cumprir é de fundamental
importância.
Porém, se apelo à consciência e responsabilidade não funcionar, só
resta à família, ciente dos direitos de seu filho e de sua
responsabilidade, recorrer às instâncias legais que irão tomar as
providências cabíveis.
FIQUE POR DENTRO
Acesso à saúde e educação regular é garantido
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
tem status de emenda constitucional no Brasil. Ela reafirma que as
pessoas com todos os tipos de deficiência devem gozar os direitos
humanos e liberdades fundamentais.
Além da Convenção, a Lei 7853/89 pune com prisão a discriminação de
pessoas com deficiência. De acordo com ela, constitui crime punível com
reclusão de um a quatro anos além de multa, a escola que recusa,
suspende, procrastina, cancela ou faz cessar, sem justa causa, a
inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou
grau, público ou privado, por motivos derivados da deficiência.
De acordo com informações da Secretaria Municipal de Educação de
Fortaleza, 2,6 mil alunos estão matriculados na rede. Todas as 451
unidades educacionais do município recebem alunos com deficiência, seja
ela física e/ou intelectual. Os mesmos estudam um período com os demais
alunos e no contraturno recebem um acompanhamento diferenciado em salas
especiais, em 116 escolas.
Já a Secretaria de Educação do Estado (Seduc) diz que o Ceará atendeu,
em 2012, 2.575 alunos com algum tipo de deficiência, matriculados na
educação básica e incluídos em escolas regulares.
A expectativa é de
ampliação desse atendimento em 2013. Em 1999, iniciou a implantação dos
Núcleos de Atendimento Pedagógico Especializado (Napes) e, em 2010,
criou, na Capital, o Centro de Referência em Educação e Atendimento
Especializado do Estado.
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