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Uma condição crônica, irreversível, incurável”. Era assim que o neurologista Acary Bulle, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explicava aos alunos do curso de medicina a situação dos pacientes com lesão na medula espinhal.
Agora, a descrição da doença começa a mudar. Um novo método cirúrgico está ajudando pacientes com paraplegia ou tetraplegia a recuperar movimentos e funções perdidos pelo trauma medular.
Feita por laparoscopia e implantação de neuroestimuladores,
a técnica aplicada desde 2012 por uma equipe multidisciplinar do
Hospital São Paulo, da Unifesp, beneficiou quatro pacientes no processo
de reabilitação.
A cirurgia consiste em implantar um neuroestimulador na região
abdominal que vai se ligar, por meio de eletrodos, aos nervos femorais,
que controlam o músculo quadríceps da coxa; aos nervos ciáticos, que
controlam os pés e o quadril, e ao nervo pudendo, responsável pelo
controle da urina e das fezes.
O ginecologista Nucelio Lemos, que trouxe
a técnica para o Brasil, explica que a neuroestimulação dos nervos
existe desde a década de 1980. A novidade é o local de implante dos
eletrodos.
“Em vez de colocá-los na coluna, implantamos os eletrodos
após a formação dos nervos, possibilitando respostas mais específicas
aos estímulos elétricos”.
Apenas quatro países (Suíça, Áustria, Alemanha e França) têm
profissionais habilitados a fazer o procedimento. De acordo com Lemos,
pouco mais de 100 pessoas foram operadas no mundo. Algumas delas,
inclusive, voltaram a andar com a ajuda de muletas.
“Um paciente da
Suíça, hoje, anda 1,5 quilômetro e, quando ele desliga o
neuroestimulador, caminha 30 metros, porque ele ganhou esse controle”,
relatou Lemos, que fez estágio no país.
O método não está disponível
pelo Sistema Único de Saúde. O custo das quatro operações, que fica em
torno de R$ 300 mil cada, foi pago pelos planos de saúde dos pacientes.
O estudante Francisco Moreira, 25 anos, foi operado em dezembro do ano
passado. O jovem é o primeiro caso de tetraplegia que se beneficiou da
técnica no país. Ele tem uma lesão medular grave causada por um acidente
com esqui há cinco anos.
Francisco apresentava dificuldades para elevar
os cotovelos acima dos ombros, mãos em garra e incontinência urinária.
“Mudou a minha sensibilidade, na sola do pé, sinto a descarga do peso. O
toque, quando estou com a meia dobrada dentro do sapato, sinto”,
relatou. Agora, ele mantém a coluna ereta sem necessidade de apoio nas
costas e consegue dormir a noite inteira sem precisar utilizar a sonda
para retirar a urina.
Francisco usa um aparelho externo, uma espécie de controle remoto, para
ativar determinados eletrodos e estimular áreas de acordo com os
movimentos que deseja.
“O aparelho tem várias programações. Uma delas é a
opção repouso, que é para quando não estou fazendo nenhuma atividade”,
disse.
Ele explica que o aparelho fica ligado para evitar os espasmos e
esfincteres contraídos (músculos que controlam fezes e urina).
O
tratamento envolve também um processo de reabilitação intensa com
fisioterapia. São necessárias pelo menos dez horas semanais de
exercícios intensos para ganho da massa muscular e coordenação.
O sucesso da neuropelveologia, como a especialidade
foi nomeada, depende da gravidade e do tempo da lesão.
“Quanto mais
precoce, maior o ganho. Apesar de não conseguimos achar os usos clínicos
seguros para as células tronco, sabemos que elas existem no organismo.
Logo após o trauma, elas estão mais presentes e é por isso que tem mais
ganhos”, explicou.
O paciente com maior tempo de lesão, operado no
Brasil, tinha 11 anos do acidente e também apresentou resultados. A
especialidade foi desenvolvida a partir de 2003 pelo médico francês Marc
Possover, radicada na Suíça.
Fonte: Deficiente Ciente
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