
A atleta paralímpica Verônica Silva Hipólito, de 17 anos, acabou de
chegar da Argentina, onde ganhou três medalhas de ouro nas corridas de
100 e 200 metros e no salto em distância nos Jogos Parapan-Americanos de
Jovens.
Neste sábado (26) e domingo (27), a jovem de Santo André (SP)
vai encarar uma prova muito mais longa, cansativa e decisiva: o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Verônica integra a equipe da seleção brasileira, cursa o 3º ano do
ensino médio, e neste ano divide o tempo entres os treinos e os estudos
para o vestibular.
Verônica sofreu há dois anos um acidente vascular cerebral (AVC).
Antes, tinha diagnóstico de um tumor na cabeça, passou por uma cirurgia,
contrariou as previsões médicas e se recuperou, mas um novo tumor
apareceu no ano passado e é controlado por medicamentos.
Como sequela do
AVC ela perdeu parte dos movimentos do lado direito do corpo, tem pouca
força na perna e na mão, e não levanta o braço completamente.
Até os problemas aparecerem, Verônica disputava competições de
atletismo "olímpico". Em abril deste ano, no entanto, ela passou a
competir como atleta paralímpica. Ela é a recordista do salto em
distância entre as atletas das Américas – marca conquistada no Parapan.
Seu maior feito, por enquanto, é a conquista da medalha de ouro nos 200
metros no Mundial Paralímpico de Atletismo, em Lyon, na França, em julho
deste ano.
Além do esporte, Verônica leva a sério a dedicação aos estudos. O Enem
permite que estudantes com alguma deficiência, como ela, solicitem no
ato da inscrição um atendimento especial durante a prova. Isso dá ao
candidato o direito de ter um tempo mais longo para finalizar as
questões. Verônica, porém, abriu mão do benefício. A estudante é destra,
mas como não tem muita força nas mãos, teve de aprender a escrever com a
esquerda também, mas nesta lhe falta coordenação. Em provas de longa
duração, como o Enem, ela costuma revezar as mãos para escrever.
Com o Enem, pretende disputar uma vaga para ciências econômicas na Universidade Federal do ABC (UFABC). Após o exame, a estudante fará os vestibulares da Fuvest, Fundação Getulio Vargas (FGV) e PUC-SP para a carreira de economia.
A jovem estuda pela manhã no Colégio Singular, de Santo André, no ABC, e
às quartas-feiras costuma ficar o dia todo na escola para reforçar o
conteúdo para o vestibular. Nas tardes dos outros dias da semana,
Verônica treina e faz ginástica em academia para ganhar força e
resistência. Seu grande sonho no esporte é disputar os Jogos
Paralímpicos de 2016, no Rio.
Apesar da paixão pelo atletismo, Verônica não quer estudar educação
física e também nunca pensou em não fazer faculdade por achar que "a
carreira de atleta não é para sempre." O curso escolhido na inscrição
dos vestibulares é economia.
"Nunca passou pela minha cabeça trabalhar
com educação física. Conversei com alguns profissionais, e acho que eu
não me daria bem. Eu não sei jogar vôlei, meu reflexo é lento, eu me
daria mal. Desisti da ginastica olímpica porque não conseguia dar uma
estrelinha. Sou um fracasso nos outros esportes", diz. No curso de
economia, Verônica pretende aprender mais sobre mercado, planejamento e
estratégia. "Quem sabe até não posso trabalhar nos comitês olímpicos?"
Com o esporte, a estudante afirma que aprendeu a controlar a ansiedade
na hora de fazer as provas da sala de aula. "Hoje eu vou para uma prova
bem mais calma. Lembro que vou ter uma hora e meia para fazê-la, não 13
segundos [tempo da prova de 100 metros]. Antes fazia uma questão muito
afobada, hoje percebo que posso seguir meu tempo, sou mais confiante.
Numa competição eu penso: se eu treinei posso ir bem, então se eu
estudei, por que não posso também?"
Verônica conta que durante o Parapan da Argentina na semana passada
levou os cadernos da escola para rever as matérias para o Enem. Ela
acredita que o padrão da prova vai se manter.
“São questões
interdisciplinares, no ano passado achei as de humanas mais complexas, e
as exatas mais fáceis. Na redação não sei o que vai ser, mas estou me
mantendo atualizada.”
O tumor diagnosticado em novembro de 2009 inchou e sangrou, o que
poderia ter provocado a morte de Verônica ou sequelas como a cegueira.
Sua recuperação desafiou a medicina que não soube explicar como ela
ficou bem. O novo tumor detectado no ano passado não tem indicação
cirúrgica porque houve uma regressão no tamanho.
“Eu controlo com remédio, não posso sofrer pancadas fortes na cabeça,
mas considero que tenho uma vida tranquila, às vezes sinto tontura, mas
já é normal, não me limito a nada. O remédio me dá sono, tomo três vezes
por semana à noite, aí fico cansada e sinto irritação, meus amigos me
aturam pra caramba", diz, aos risos.
Verônica não se revolta com os problemas de saúde que a afetam. Ela diz
que depois que teve o AVC e passou a disputar como atleta paralímpica,
se tornou uma pessoa melhor.
“Minhas amigas diziam que eu era rabugenta,
hoje eu brinco, saio, conheci pessoas maravilhosas nos campeonatos
paralímpicos. Eu passei a me sentir muito bem, sou feliz, não tenho nada
para reclamar. Nas competições, um deficiente brinca com outro, tira
sarro da deficiência, é engraçado. Não dá para ficar reclamando, tem de
aprender a conviver com a deficiência e entender que ela vai te trazer
coisas boas.”
Fonte: G1
Fonte: G1
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