Para Erick Higa, jogador de tênis de mesa, sua
deficiência foi um dos fatores que mais impulsionou a carreira como
atleta profissional.
Erick nasceu com pés tortos congênitos, uma
deformidade que atinge 1 a cada 1000 recém-nascidos e que faz com que os
pés sejam voltados para dentro.
Aos seis meses, realizou uma cirurgia
para correção do problema. O procedimento foi um sucesso e os pés
ficaram tecnicamente iguais, com uma pequena diferença de tamanho.
A maior parte das crianças que passam por esse tipo
de tratamento apresenta ótimos resultados, embora alguns resquícios,
como a diferença de tamanho dos pés e diminuição do diâmetro da
panturrilha, persistam: “Foi um trabalho muito bom, só que com isso eu
tive limitação dos movimentos dos pés,(…). Ele [o pé] fica parado,
travado, tanto que não é possível fortalecer a panturrilha direito”.
Essas condições não o impediam de praticar atividades
físicas regulares, então Higa treinava diversos esportes entre pessoas
sem deficiência, como vôlei, futebol, handebol, baseball, natação: “A
minha vida inteira eu quis fazer esporte e fui testando vários até
encontrar o tênis de mesa, que se encaixou muito bem comigo.”
A ideia de competir em modalidades paralímpicas
partiu de seu técnico, Mauro Uwagoya, que lhe falou sobre a
possibilidade de conseguir uma bolsa atleta, um incentivo em dinheiro
para se dedicar mais ao esporte de maneira profissional. Sua condição
impede que ele use a ponta do pé como apoio, fazendo com que force o
calcanhar e comprometa a sua movimentação.
As competições paralímpicas são divididas em classes
de 1 a 10, sendo a 11 reservada para paralisados cerebrais; quanto maior
a classe, menor o grau da deficiência do atleta. “De 1 a 5 são
cadeirantes e de 6 a 10 são andantes”, explica Erick.
“Eu sou categoria
9. Minha deficiência é relativamente pequena, mas tem gente com ainda
menos deficiência que eu”.
Seu primeiro objetivo era conseguir a bolsa atleta
nacional, conquistada caso ficasse entre os três melhores do país em sua
classe:
“No primeiro ano, eu não consegui. Eu achei que ia ser um pouco
mais tranquilo porque ia jogar com pessoas com deficiência também, só
que eles são muito bons e eu fui massacrado [risos]”.
Depois de um tempo de mais treinos e prática em
competições paralímpicas, que exigem uma estratégia diferente, Erick
passou a conseguir títulos de maior expressão em campeonatos nacionais:
terceiro e segundo lugar, às vezes primeiro.
Esses resultados chamaram a
atenção da Seleção Brasileira de Tênis de Mesa durante uma “caça” de
talentos. Jogando pela Seleção, passou a frequentar muitos torneios fora
do Brasil.
Segundo o atleta, o melhor momento de sua carreira
foi justamente durante um torneio internacional. Enfrentando Vadym
Kubov, sétimo do mundo em sua classe na época e de quem já havia perdido
diversas partidas, conseguiu abrir uma vantagem e vencer o adversário:
“Eu comemorei muito, o pessoal da seleção que estava comigo torcendo
invadiu a área de jogo, me abraçaram”.
Em 2013 participou dos Jogos
Parapan-americanos, entre outras competições pela Seleção. Porém, a
rotina do centro de treinamento em Piracicaba fez com que pensasse em
desistir:
“Era muito puxado pro psicológico (…). Comecei a jogar sem
vontade, não estava mais feliz com o que eu estava fazendo. Tem gente
que consegue levar, eu já não porque sempre prezei muito minha
felicidade, ai eu pedi pra sair.”
Voltou a viver em São Paulo e a treinar com seu
antigo técnico, além de ter mais tempo para outras atividades além do
esporte, como a faculdade de Design de Games que começou a cursar na
metade de 2013.
“Agora eu sou um atleta normal, ainda forte no Brasil.
Quando tem torneio grande, normalmente eu sou convocado pra uma seletiva
e vou me mantendo parcialmente na seleção através dessas competições”,
conta Higa.
Ainda este ano, disputará mais um Parapan em agosto,
no Canadá, em busca de uma vaga para participar das Paralimpíadas de
2016.
Seu outro objetivo é conquistar resultados nas modalidades
olímpicas, mais difíceis e concorridas. “Como eu sou do paralímpico, já
conquistei altos títulos, mas eu não vejo isso como uma grande vitória,
porque eu vejo pessoas [não deficientes] do meu nível, e até melhores,
que não tem o mesmo nome que eu tenho. No olímpico, eu também jogo às
vezes mas, como eles, eu sou só mais um.”
Segundo o próprio atleta, as modalidades olímpicas
são muito mais difíceis e exigem um grau de comprometimento maior.
“Nesse ponto, a deficiência me ajudou bastante no esporte, porque muita
gente parou por não conseguir ter um resultado e viu que não ia muito
mais pra frente”.
Foram as conquistas expressivas no esporte paralímpico
que permitiram que Erick conseguisse uma bolsa atleta e pudesse se
sustentar através do esporte, enquanto outros tiveram de fazer a escolha
entre trabalhar e continuar treinando.
Como o paralímpico não tem uma “idade-teto”, o atleta
pretende se manter jogando profissionalmente por quanto tempo for
capaz.
“Eu penso em talvez ser técnico, quando eu não puder
mais competir. Já dou assistência pra crianças onde eu treino”. Dentro
ou fora de quadra, no olímpico ou no paralímpico, o importante para
Erick Higa é que seu futuro esteja no esporte.
Fontes: Revista BEAT / Rede Saci
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