1 de abr. de 2015

Deficiência Como Motivadora do Esporte


 


Para Erick Higa, jogador de tênis de mesa, sua deficiência foi um dos fatores que mais impulsionou a carreira como atleta profissional. 


Erick nasceu com pés tortos congênitos, uma deformidade que atinge 1 a cada 1000 recém-nascidos e que faz com que os pés sejam voltados para dentro. 


Aos seis meses, realizou uma cirurgia para correção do problema. O procedimento foi um sucesso e os pés ficaram tecnicamente iguais, com uma pequena diferença de tamanho.


A maior parte das crianças que passam por esse tipo de tratamento apresenta ótimos resultados, embora alguns resquícios, como a diferença de tamanho dos pés e diminuição do diâmetro da panturrilha, persistam: “Foi um trabalho muito bom, só que com isso eu tive limitação dos movimentos dos pés,(…). Ele [o pé] fica parado, travado, tanto que não é possível fortalecer a panturrilha direito”.


Essas condições não o impediam de praticar atividades físicas regulares, então Higa treinava diversos esportes entre pessoas sem deficiência, como vôlei, futebol, handebol, baseball, natação: “A minha vida inteira eu quis fazer esporte e fui testando vários até encontrar o tênis de mesa, que se encaixou muito bem comigo.”


A ideia de competir em modalidades paralímpicas partiu de seu técnico, Mauro Uwagoya, que lhe falou sobre a possibilidade de conseguir uma bolsa atleta, um incentivo em dinheiro para se dedicar mais ao esporte de maneira profissional. Sua condição impede que ele use a ponta do pé como apoio, fazendo com que force o calcanhar e comprometa a sua movimentação.


As competições paralímpicas são divididas em classes de 1 a 10, sendo a 11 reservada para paralisados cerebrais; quanto maior a classe, menor o grau da deficiência do atleta. “De 1 a 5 são cadeirantes e de 6 a 10 são andantes”, explica Erick. 


“Eu sou categoria 9. Minha deficiência é relativamente pequena, mas tem gente com ainda menos deficiência que eu”.


Seu primeiro objetivo era conseguir a bolsa atleta nacional, conquistada caso ficasse entre os três melhores do país em sua classe: 


“No primeiro ano, eu não consegui. Eu achei que ia ser um pouco mais tranquilo porque ia jogar com pessoas com deficiência também, só que eles são muito bons e eu fui massacrado [risos]”.


Depois de um tempo de mais treinos e prática em competições paralímpicas, que exigem uma estratégia diferente, Erick passou a conseguir títulos de maior expressão em campeonatos nacionais: terceiro e segundo lugar, às vezes primeiro. 


Esses resultados chamaram a atenção da Seleção Brasileira de Tênis de Mesa durante uma “caça” de talentos. Jogando pela Seleção, passou a frequentar muitos torneios fora do Brasil.


Segundo o atleta, o melhor momento de sua carreira foi justamente durante um torneio internacional. Enfrentando Vadym Kubov, sétimo do mundo em sua classe na época e de quem já havia perdido diversas partidas, conseguiu abrir uma vantagem e vencer o adversário:


“Eu comemorei muito, o pessoal da seleção que estava comigo torcendo invadiu a área de jogo, me abraçaram”.


Em 2013 participou dos  Jogos Parapan-americanos, entre outras competições pela Seleção. Porém, a rotina do centro de treinamento em Piracicaba fez com que pensasse em desistir: 


“Era muito puxado pro psicológico (…). Comecei a jogar sem vontade, não estava mais feliz com o que eu estava fazendo. Tem gente que consegue levar, eu já não porque sempre prezei muito minha felicidade, ai eu pedi pra sair.”


Voltou a viver em São Paulo e a treinar com seu antigo técnico, além de ter mais tempo para outras atividades além do esporte, como a faculdade de Design de Games que começou a cursar na metade de 2013. 


“Agora eu sou um atleta normal, ainda forte no Brasil. Quando tem torneio grande, normalmente eu sou convocado pra uma seletiva e vou me mantendo parcialmente na seleção através dessas competições”, conta Higa.


Ainda este ano, disputará mais um Parapan em agosto, no Canadá, em busca de uma vaga para participar das Paralimpíadas de 2016. 


Seu outro objetivo é conquistar resultados nas modalidades olímpicas, mais difíceis e concorridas. “Como eu sou do paralímpico, já conquistei altos títulos, mas eu não vejo isso como uma grande vitória, porque eu vejo pessoas [não deficientes] do meu nível, e até melhores, que não tem o mesmo nome que eu tenho. No olímpico, eu também jogo às vezes mas, como eles, eu sou só mais um.”


Segundo o próprio atleta, as modalidades olímpicas são muito mais difíceis e exigem um grau de comprometimento maior. 


“Nesse ponto, a deficiência me ajudou bastante no esporte, porque muita gente parou por não conseguir ter um resultado e viu que não ia muito mais pra frente”. 


Foram as conquistas expressivas no esporte paralímpico que permitiram que Erick conseguisse uma bolsa atleta e pudesse se sustentar através do esporte, enquanto outros tiveram de fazer a escolha entre trabalhar e continuar treinando.


Como o paralímpico não tem uma “idade-teto”, o atleta pretende se manter jogando profissionalmente por quanto tempo for capaz. 


“Eu penso em talvez ser técnico, quando eu não puder mais competir. Já dou assistência pra crianças onde eu treino”. Dentro ou fora de quadra, no olímpico ou no paralímpico, o importante para Erick Higa é que seu futuro esteja no esporte.


Fontes: Revista BEAT   /   Rede Saci


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