A estudante de assistência social Regina Borges, 43 anos, pratica dança cigana há mais de 20 anos e decidiu usar a técnica para melhorar a qualidade de vida de pessoas com deficiência de Luziânia, no Entorno do Distrito Federal.
Ela fundou o grupo “Bailando com a Vida”, no qual dez cadeirantes
participam ativamente das coreografias.
O resultado obtido com o
trabalho virou uma pesquisa acadêmica, cujo resultado foi apresentado
durante um congresso em São Paulo.
Regina conta que sempre foi apaixonada pela dança cigana e, quando
estava no palco, pensava em como era realizada por poder executar os
passos. No começo de 2010, antes de fundar o grupo, ela esteve em um
teatro de Brasília, onde assistiu a uma apresentação de pessoas em
cadeira de rodas.
“Eles dançavam um estilo mais clássico, mas foi tudo
muito lindo. Aí eu pensei que a dança cigana se encaixaria muito bem, já
que ela exige muitos movimentos com os braços, o que é plenamente
possível aos cadeirantes”, lembra.
Em março daquele ano, ela iniciou o projeto em Luziânia, cidade com
aproximadamente 174.500 habitantes, segundo dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Destes, mais de 22% apresentam algum tipo de deficiência. Ao pesquisar
sobre o tema, Regina decidiu, então, criar um grupo no município, mas
conta que enfrentou um pouco de resistência.
Eu passei a divulgar o meu
projeto, mas ninguém parecia se interessar. Até que o primeiro
cadeirante apareceu e trouxe um amigo e assim por diante. Atualmente,
são dez integrantes que tiveram suas vidas transformadas”, afirma a
estudante.
Projeto científico
A estudante lembra que o trabalho com os deficientes foi iniciado antes
de cursar assistência social na Faculdade Anhanguera, em Luziânia. Mas
no decorrer dos anos, os colegas foram se interando sobre o grupo de
dança.
“Aí, em setembro de 2012, um professor conheceu o meu projeto e
me convidou para participar da iniciação científica”, conta.
Regina montou, então, um questionário com 16 questões, nos quais os
cadeirantes responderam sobre aspectos que mudaram nas suas vidas após o
grupo de dança. “
O estudo apontou uma melhora significativa na
autoestima dos envolvidos e na integração social. A entrada no grupo foi
o agente motivador da mudança”, explica a estudante.
Uma das perguntas feitas ao grupo foi se eles se sentiam inúteis nos
grupos sociais a que pertecem. No primeiro questionário, aplicado em
janeiro deste ano, 50% dos cadeirantes disseram "sim". A mesma pergunta
foi aplicada em julho passado, após a intensificação das atividades de
dança, e apenas 10% voltaram a concordar com a realidade.
"Isso mostra
que houve um avanço muito grande, pois eles puderam enxergar que podem
ser inseridos na vida cultural e ter atividades como qualquer pessoa",
destacou a estudante.
Os resultados obtidos com a pesquisa foram apresentados no 13º
Congresso Nacional de Iniciação Científica (Conic), realizado em 29 e 30
de novembro, na Faculdade Anhanguera, em Campinas (SP), pelo Sindicato
das Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior do Estado de São
Paulo (Semesp).
“A expectativa é muito grande, pois, se aprovado, o
projeto poderá servir de modelo para que outras pessoas que trabalham
com deficientes possam promover a inclusão social dos mesmos”, ressaltou
Regina.
Após a conclusão do curso, prevista para o ano que vem, a goiana
pretende fazer uma pós-graduação e ampliar a atuação do Bailando com a
Vida. “
Agora que sei que a dança cigana pode, sim, ser praticada por
pessoas com deficiência, quero desenvolver um projeto para pessoas com
síndrome de Down, tetraplégicos, déficit mental, entre outros”,
ressaltou.
Bailando com a Vida
Regina explica que o trabalho no grupo basicamente consiste em criar
coreografias, nas quais os deficientes estão inseridos. Antes de
iniciar, muitos apresentavam quadros de depressão e receio até de sair
de casa.
“É comum que a gente tenha medo de novas experiências. Imagine
para alguém que tenha alguma deficiência e lute todos os dias com as
dificuldades cotidianas. Quando começamos o trabalho, todos tinham
vergonha de se expor ao público e muitos nem tinham mais expectativa de
vida”, conta.
Segundo ela, aos poucos, a realidade dos participantes foi mudando,
principalmente em fatores relacionadas à autoestima. “A gente se reúne
periodicamente para os ensaios e durante esses encontros eles, além de
se exercitar, podem conversar uns com os outros e trocar experiências.
Isso foi enriquecendo a vida de cada um e hoje os resultados são
incríveis. Um deles era tão tímido que mal saía de casa, mas no grupo
conheceu uma pessoa e hoje eles são casados”, lembra a pesquisadora.
A pessoa com deficiência citada é José Raimundo Silva, 37 anos, que
afirma que o Bailando com a Vida lhe trouxe uma nova motivação para
seguir em frente. "Participando do grupo, readquiri autoconfiança. Me
sinto capaz de realizar funções que as pessoas sem deficiência realizam.
A dança me reabilitou para a vida", contou o cadeirante.
Segundo Regina, nestes três anos de existência do grupo, ela pôde
comprovar a força da dança como meio importante para devolver a
autoestima dos deficientes. “No grupo, tínhamos um participante que era
alcoólatra e estava se entregando ao vício. Outro apresentava quadro de
depressão e fazia o uso de medicamentos para controlar o mal. Hoje,
todos eles estão bem e aprenderam a lidar melhor com as dificuldades
geradas pela deficiência. O Bailando com a Vida virou uma motivação
tanto para eles quanto para mim”, ressalta.
Apesar da iniciativa que ajuda a melhorar a qualidade de vida dos dez
moradores de Luziânia, o projeto de Regina ainda segue sem apoio
financeiro e tudo é feito de maneira independente. “Eu mesma providencio
as fantasias e agendo as apresentações que iremos fazer. Tudo dá muito
trabalho, mas o resultado é enriquecedor”, afirma.
Segundo ela, até o transporte dos dançarinos para os espetáculos é um
desafio. “Sempre temos que alugar vans que nos levem aos locais das
apresentações, mas nem sempre é fácil encontrar pessoas dispostas a
levar um grande número de deficientes e suas cadeiras de rodas.”
E é assim que o grupo realiza o trabalho, com muito esforço e recursos
próprios. “Já chegamos a pensar em cobrar pelo show, mas a resistência,
infelizmente, ainda é muito grande quando se fala em um grupo de
cadeirantes.
Mesmo assim, estamos na luta e não vamos desistir de
mostrar nosso trabalho”, ressalta Regina.
Fonte: G1 Goiás
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