O hábito de pedalar tem conquistado cada vez mais adeptos no Brasil.
Como forma de lazer – nos passeios ciclísticos, "bicicletadas" noturnas e
nos parques nos finais de semana –, ou de transporte, andar de
bicicleta pode ser considerado algo simples, principalmente para quem
enxerga bem. Para os deficientes visuais, entretanto, trata-se de uma atividade desafiante.
Da mesma forma, banhar-se em alguma das praias espalhadas pelos mais de
7 mil quilômetros do litoral brasileiro também pode ser bastante
difícil para quem depende, por exemplo, de uma cadeira de rodas para se locomover.
Alguns projetos, em vários pontos do Brasil, oferecem alternativas para
que pessoas com deficiência visual ou cadeirantes também pratiquem
essas atividades. Criados a partir de iniciativas individuais, com apoio
de empresas, ONGs, governos regionais e também de voluntários, esses
projetos locais servem de exemplo e têm sido reproduzidos.
Criado em 2004 em Brasília, o projeto DV na Trilha é um exemplo da
parceria entre voluntários e instituições locais, que juntaram esforços
para que deficientes visuais pudessem andar de bicicleta. Munidos de 20
bicicletas Tandem, com dois lugares – um para o condutor, o outro para o
deficiente visual –, o grupo se reúne quinzenalmente no Jardim Botânico
de Brasília e participa de eventos esportivos na cidade.
"A impressão que temos é que muitas pessoas estavam apenas esperando
uma oportunidade para fazer o bem. Bastou apresentarmos a possibilidade
para que elas ajudassem e virassem voluntárias ou apoiadoras", conta
Simone Cosenza, uma das coordenadoras do projeto.
No Rio Grande do Sul, outro projeto, pensado pelo empreendedor social
Josué Aguar, da ONG Embrião, também promove inclusão de deficientes
visuais. A organização, cuja sede está localizada na cidade de Alvorada,
região metropolitana de Porto Alegre, já fazia passeios ciclísticos na
semana do meio ambiente. Os deficientes visuais começaram a querer
participar.
"A gente se sentiu na obrigação de criar uma bicicleta especial e aí
surgiu o ODKV (o de cá vê)", explica Josué, fazendo referência ao
formato do aparelho, que é a junção de duas bicicletas com barras
paralelas.
O primeiro modelo foi produzido com a ajuda de amigos
serralheiros, usando duas bicicletas antigas que ele tinha em casa.
Hoje, o projeto recebe doações de voluntários e de instituições como
delegacias, e já inspirou outras instituições em Sergipe, na Bahia e em
Alagoas.
Além de ampliar o círculo social – tanto dos voluntários, como dos
deficientes –, os encontros do grupo DV na Trilha também ajudam no
desenvolvimento de habilidades esportivas.
"Eles começam a perceber
diferenças também no seu corpo, em função da prática do esporte e, como
sempre estamos participando de competições, eles têm a oportunidade de
receber medalhas de participação", relatou Simone Consenza, do DV na
Trilha.
Um exemplo dessa possibilidade de profissionalização é o ex-treinador
de cães e hoje atleta Adauto Belle, que perdeu significativamente a
visão aos 18 anos. Ele conheceu o projeto enquanto treinava um dos cães
de Simone, em 2007, e desde então vem superando metas.
"Eu sou meio
exagerado nas coisas", brinca, em conversa com a DW Brasil. Ele começou a
pedalar por lazer e "de repente já estava dentro do Parapan na
Colômbia".
Na última semana, Adauto completou a prova Brasil Ride, percorrendo de
mountain bike, numa Tandem, mais de 600 quilômetros na Chapada
Diamantina, em sete dias. Seu companheiro de competição foi o triatleta e
voluntário no projeto Leandro Macedo, campeão do Circuito Mundial em
1991, dos Jogos Pan-Americanos de 1995, e representante do Brasil nas
Olimpíadas de Sidney e Atenas.
Com os últimos resultados, Adauto e Leandro estão se preparando para as Paralimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro.
As rodas também são o meio para tornar acessível uma outra atividade
aos portadores de deficiência física: aproveitar um banho de mar. Isso
parecia impossível sobre as cadeiras de roda tradicionais, mas com o uso
das chamadas "cadeiras anfíbias" – com rodas e materiais especiais que
permitem locomoção na areia e flutuação – não há mais barreiras.
No estado de Pernambuco, o projeto chamado Praia Sem Barreiras começou
na Ilha de Fernando de Noronha, sendo depois implantado nas praias do
Recife, Olinda e Porto de Galinhas. Além do banho assistido com as
cadeiras anfíbias, o projeto inclui uma tenda de fisioterapia e quadra
para prática de vôlei sentado.
Já no Rio Grande do Sul, o projeto Praia Acessível começou no ano
passado, sendo realizado em várias cidades do litoral gaúcho. Como os
equipamentos adaptados, os cadeirantes podem aproveitar o banho de mar
assistido, acompanhado por profissionais de educação física,
fisioterapia e terapia ocupacional.
A educadora física Cláudia Alfama, da Fundação de Articulação e
Desenvolvimento de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência e
Altas Habilidades (Faders), órgão responsável pelo projeto no estado,
explica que a vantagem da equipe de apoio é que o banho de mar acaba
tenho funções também terapêuticas.
"O fisioterapeuta está dando banho conversando com os familiares,
dependendo do tipo de deficiência, está falando sobre a importância de
alongamento, para melhor a qualidade de vida", diz Cláudia.
"Nosso
objetivo maior é criar uma política de Estado para que as praias de todo
o litoral norte, sul e Costa Doce adotem os projetos", aponta a
funcionária da Faders.
Fonte: DW
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